quarta-feira, 31 de março de 2010

Saiba porque a maioria da população (e dos cristãos) nos EUA opõe-se ao "Obamacare". E quem disse que o financiamento do aborto não foi aprovado?

Quase que invariavelmente, quando a imprensa secular aborda um tema que envolve questões que podem imprimir nóduas em algum ícone de suas predileções liberais (quando falo "liberais", refiro-me ao social liberalism), ela – ou boa parte dela – se dedica à desinformação. E em alguns casos, essa dedicação é tão descarada que as análises de conjuntura que as “cabeças pensantes” desse meio nos apresentam chegam a ser ofensivas, no sentido de que, ao lê-las ou assisti-las, ficamos a nos perguntar indignados: “Será que eles acham mesmo que nós, leitores, internautas e telespectadores, somos um bando de ingênuos e idiotas para aceitar explicações como essas?”
Durante os últimos dias, jornais, sites e programas televisivos têm simplesmente praticado desinformação descarada em relação a alguns assuntos, e um deles é a oposição da maioria da população dos Estados Unidos à reforma no sistema público de saúde proposta por seu presidente Barack Hussein Obama.
Na noite de terça-feira (23/03), por exemplo, um comentarista da principal rede de televisão de nosso país, quando foi chamado para explicar porque 59% da população dos EUA é contra a lei de reforma do sistema público de saúde proposta por Obama (chamada de Obamacare), e porque promotores de dezenas de Estados entraram com ações declaratórias de inconstitucionalidade contra ela imediatamente após Obama assiná-la, simplesmente disse que isso se deve “ao racismo e ao egoísmo da direita americana” (sic).
Apresentar uma explicação dessas aos telespectadores é chamá-los de idiotas.
Quer dizer que 182 milhões de americanos são absolutamente contra o Obamacare e outros 6,2 milhões estão seriamente indecisos em apoiá-lo porque são todos um bando de "racistas e egoístas"?!? Quer dizer que a maioria esmagadora da população se opõe a esse projeto porque é – conforme dizeres do mesmo comentarista dias antes – “gente que acredita que Deus acha que os pobres merecem ser pobres mesmo”?!?
Só porque Obama defende todos aqueles ideais socialmente liberais esposados pela maioria dos formadores de opinião da sociedade de hoje (aborto, casamento homossexual, liberação de drogas, eutanásia etc), esses seus fãs na imprensa tupiniquim omitem deliberadamente as críticas mais contundentes ao governo de seu amado e o cerne de todas as questões polêmicas em torno de suas medidas, fazendo com que qualquer oposição a ele que seja mencionada por aqui pareça, aos olhos de seus leitores e telespectadores, incompreensível, nonsense, bizarra, maluca, surreal. Assim, segundo essa turma, se cerca de 60% dos americanos são contra a reforma do sistema público de saúde proposta por Obama, só pode ser por "racismo", "egoísmo" ou um surto coletivo de estupidez e insensibilidade.
Qual as verdadeiras razões pelas quais 182 milhões de americanos se posicionarem totalmente contra essa reforma como está sendo proposta? Vamos aos fatos – que envolvem, inclusive, valores que, nós, cristãos, prezamos muito.

A verdade sobre o Obamacare

Nos Estados Unidos, há tanto o seguro de saúde público quanto o privado. Ao todo, 85% da população (262 milhões de americanos) têm algum seguro-saúde. Para ser mais preciso, 58,5% da população (181 milhões de americanos) têm seguro-saúde privado, seja ele empresarial ou particular, enquanto 26,5% (81 milhões) têm seguro-saúde público. Os seguros-saúde públicos dos EUA são o Medicaid, para os pobres; o Medicare, para os idosos; e o seguro-saúde para os militares. São esses três que atendem a 26,5% da população.
E os 15% restantes da população (46,2 milhões de pessoas) que não têm nenhum seguro-saúde? É em torno deles que se começou a construir a falácia.
Quando lemos ou assistimos matérias sobre o assunto por aqui, geralmente passa-se a idéia de que esses 46,2 milhões de pessoas nos EUA sem nenhuma espécie de seguro-saúde são todos (1) cidadãos americanos (2) pobres e (3) frustrados por não terem um plano de saúde. Não! Para começar, desses 46,2 milhões sem plano de saúde, 11,6 milhões não são cidadãos americanos, mas imigrantes ilegais, que não têm direito a seguro-saúde nos EUA justamente porque entraram e estão naquele país ilegalmente. Dentre eles, há gente que não tem condições financeiras de ter um seguro-saúde e outros que têm, mas não contratam um por temerem serem identificados e deportados. Uma coisa é ser a favor de que imigrantes ilegais tenham direito a alguma cobertura pública de seguro-saúde quando precisarem eventualmente de atendimento médico (como a oposição ao Obamacare defende), outra bem diferente é não compreender a posição da maioria dos cidadãos americanos que é contra a proposta de dar benesses permanentes a pessoas que vivem ilegalmente em seu país (defendida pelo Obamacare). Posso pessoalmente não concordar, mas não posso considerar essa reivindicação ilegítima e/ou sem sentido. Mas, prossigamos, até porque a principal questão não é essa.
Ainda dentro desses 46,2 milhões, há 13,2 milhões que são jovens universitários que não têm, e a maioria deles nem se interessa ainda em ter (segundo pesquisa do próprio governo americano), um plano de saúde em seu nome; e, finalmente, também há 4 milhões de americanos com tanto dinheiro que se dão ao luxo de não terem plano de saúde nenhum.
Enfim, esses três grupos (imigrantes ilegais, jovens universitários nem sempre preocupados em terem uma seguro-saúde e ricos desinteresssados em seguro-saúde) perfazem um total de 28,8 milhões de pessoas. Ou seja, o número real de (1) cidadãos americanos (2) pobres que (2) clamam por um seguro-saúde, pobres que não são alcançados pelo Medicaid, não é de 46,2 milhões, como a imprensa daqui sugeria no início, nem de 33 (ou 32 ou 31) milhões, como estão dizendo agora, mas de 16,4 milhões de pessoas – ou, na pior das hipóteses, 22 milhões, como sugerem alguns (tirando da lista apenas os imigrantes ilegais + as 13 milhões de pessoas [dentre os 13,2 milhões de universitários e os 4 milhões de ricos sem plano de saúde] que disseram em pesquisa do governo que não se importam em ter um seguro-saúde). Esses dois números prováveis - 16,4 milhões ou 22 milhões - representam respectivamente apenas 5,3% e 7% da população americana. Significam bem menos da metade do que se sugeria inicialmente, e com isso não estou dizendo que esses 16 a 22 milhões devem ser ignorados. A questão, nesse primeiro ponto, é que carrega-se demasiadamente na tinta, infla-se o tamanho do problema, para forçar a aceitação de uma reforma que apresenta vários problemas, além de ferir valores.
O número total de pobres nos Estados Unidos hoje é oficialmente de 39,8 milhões (13% da população). “E quem é que define quem é pobre nos EUA?” O próprio governo americano. Segundo o governo, americanos pobres são aqueles que fazem parte de uma família de pelo menos quatro pessoas cuja renda anual não ultrapassa US$ 22.050 (em 48 Estados; no Alasca, a referência é US$ 27.570; e no Havaí, US$ 23.560) e os idosos com mais de 65 anos que tenham renda anual pessoal abaixo de US$ 10.830 (em 48 Estados; no Alasca, 13.530; e no Havaí, 12.460). Como vimos, há atualmente cerca de 40 milhões de cidadãos americanos enquadrados nessa situação, sendo que mais de 23 milhões deles já são atendidos pelo Medicaid. O número real dos que não são atendidos é, como vimos, de 16,4 milhões. E aqui chegamos ao segundo ponto.
Bem, se existem 16,4 milhões de americanos pobres que não são beneficiados pelo Medicaid, por que não se investe apenas numa reforma para que a cobertura de seguro-saúde para os pobres alcance e beneficie também esses pobres que ainda não são cobertos pelo Medicaid e, claro, melhore também os serviços do Medicare e Medicaid? Existia uma proposta que parecia muito boa nesse sentido que era a do senador Jim DeMint, da Carolina do Sul, e que é chamada de “Plano de Liberdade e Saúde”. Ela parece ter tido mais aceitação entre os críticos do Obamacare. Porém, infelizmente, por DeMint ser republicano – partido de oposição – e o projeto de reforma do sistema de saúde nos moldes defendidos por Obama ser uma bandeira antiga do Partido Democrata, tendo sido levantada originalmente pelo recentemente falecido Ted Kennedy e defendida pela turma de Obama já há três anos, simplesmente Obama e sua trupe democrata preferiram deixar de lado a apreciação do plano bem-recepcionado de DeMint para empurrar “goela abaixo” do cidadão americano uma reforma que sofre resistência por, entre outras coisas, aumentar consideravelmente os impostos e, como se não bastasse isso, forçar paulatinamente a maioria esmagadora dos cidadãos daquele país a ser segurada pelo Estado, levando à quebra de centenas de companhias de seguro-saúde privadas. Não, eu não estou exagerando. Além de ser a conseqüência lógica e óbvia da implementação do projeto, veja com seus próprios olhos e ouça com seus próprios ouvidos aqui Barack Hussein Obama e sua turma asseverando que o objetivo final da reforma é “eliminar todas as companhias de seguro-saúde do mercado”. Veja e ouça com todas as cores e letras. Simplesmente, a administração Obama vê as companhias de seguro-saúde privadas como um mal e quer quebrar todas elas para monopolizar o mercado de seguros. E a desculpa para isso é que essas medidas são necessárias para que todos na população tenham direito a um seguro-saúde público de alto nível e, assim, não precisem recorrer a um seguro-saúde privado. Porém, cerca de 60% dos americanos não querem ser segurados pelo Estado; eles preferem ter planos de saúde privados.
No vídeo disponibilizado no link do parágrafo acima, Obama, quando ainda estava em campanha, afirma explicitamente que é “defensor de um sistema de saúde universal para a América” em que todas as pessoas “pagam unicamente por esse sistema de seguro-saúde” – ou seja, nada de companhias privadas de seguro-saúde, só o “SUS (Sistema Único de Saúde) dos EUA” para os americanos. E ele explica que o plano é não chegar a isso imediatamente, mas paulatinamente.
Ainda no vídeo, o Dr. Jacob Stewart Hacker, 39 anos, professor de Ciência Política na Universidade de Yale e um dos maiores idealizadores e defensores do Obamacare, explica, em 11 de janeiro de 2007, que esse sistema universal de saúde proposto objetiva “a eliminação de um grande segmento do setor de seguros-saúde”. Mais à frente, Jacob ainda diz que deve-se ter cuidado para “não assustarmos as pessoas” de cara revelando que elas “vão perder os seus seguros privados”.
No mesmo vídeo, Jan Schakowsky, parlamentar do Partido Democrata de Illinois (Estado de Obama) e uma das principais defensoras do Obamacare, afirma (sob aplausos) acerca do objetivo da reforma, em discurso a seus apoiadores em 18 de abril de 2009: “A opção pública colocará a indústria de seguros privados fora do negócio e levará os contribuintes a pagarem apenas o sistema público”. E qual o argumento usado para tentar vender aos incautos uma proposta dessas? O argumento da “escolha”, quando, na verdade, o projeto não objetiva meramente aumentar as opções de escolha dos americanos na área de seguro-saúde, mas, sim, criar um sistema de saúde universal que, segundo as palavras do próprio Obama, “é uma opção pública que concorrerá fortemente com as companhias de seguro-saúde privadas”, isto é, uma concorrência estatal que objetiva vencer a privada para reinar absoluta nesse mercado.
O projeto de reforma estabelece uma regulação rígida das companhias de seguro, regulação essa cuja implementação leva gradativamente ao sufocamento e à eliminação dessas companhias, e conseqüentemente ao monopólio do governo na área de seguro-saúde. Ou seja, no final, não sobrarão escolhas, mas apenas uma escolha.
Ademais, obrigar todos os americanos a pagarem um seguro-saúde viola os princípios da Constituição americana. Isso fere o princípio da liberdade defendido pela Carta Magna dos EUA. Na maior democracia do mundo, onde, por causa dos princípios constitucionais, votar não é obrigatório; servir no Exército, Marinha ou Força Aérea não é obrigatório; e cada um administra sua própria previdência em vez de o Estado obrigá-los a pagar uma previdência pública... o governo quer obrigar todo cidadão a pagar um seguro-saúde!
Pelo projeto aprovado domingo, o americano tem até meados da década seguinte para ter um seguro-saúde, se não será obrigado a pagar uma multa anual que hoje seria de 750 dólares por pessoa ou 2.250 dólares por família - e quem não pagar vai preso. Somente os que não têm condições de pagar por um seguro (os considerados pobres) serão cobertos gratuitamente pelo governo (uma das poucas coisas boas do projeto). Mas, além de obrigar quem não quer ter um plano de saúde a ter um, o projeto endurece com as companhias de seguro-saúde, que já anunciaram que as novas medidas impostas pela lei que estabelece essa reforma forçá-las-ão a elevar os preços dos seus planos, o que conseqüentemente empurrará a população a migrar gradativamente do plano privado para o público. Isso resultará na quebradeira de centenas de companhias de seguro-saúde, em dezenas de milhares de desempregados, na elitização dos poucos seguros-saúde privados que eventualmente continuem a existir após a quebradeira e no monopólio do governo na área de seguro-saúde. Sendo que, hoje, como já ressaltamos, 58,5% dos americanos já têm um seguro-saúde privado e, mesmo com o aumento nos últimos anos no preço dos seguros-saúde, não querem migrar para um seguro-saúde do governo, além de outros milhões de americanos ricos que querem permanecer tendo o direito de não pagarem por seguro-saúde algum (inclusive, pelo projeto aprovado domingo, a porcentagem da multa anual sobre estes últimos é muito maior, bem como o valor que pagarão para manter o sistema universal público de saúde).
Perceba: não se está dizendo que não há injustiças cometidas por companhias de saúde e nem que elas não precisem de alguma regulação. Existem, e por isso suas atividades precisam, sim, ser melhor regulamentadas. Mas, do jeito como propõe o projeto, o resultado final será não um melhor serviço delas, mas a extinção nos próximos anos da maioria esmagadora dessas companhias, como confessa o próprio Obama e sua turma, que têm constantemente satanizado todas as companhias de seguro-saúde para justificar e estimular uma migração do povo para as mãos do Estado.
Ora, se há problemas no comportamento de muitas dessas companhias, regulamente-se melhor suas atividades, e seus abusos serão reparados na justiça. Fazê-las quebrar para todos ficarem dependentes do governo não é resolver o problema, mas criar um maior. Imagine, querido leitor, o que é ficar na mão de um monopólio, e um monopólio estatal, onde burocratas do governo é quem irão definir se você deve ou não fazer o tratamento que o seu médico disse que você precisa fazer; onde um tratamento que seu médico passa e você aprova não poderá ser feito porque “pesquisas do governo” indicam que um outro tratamento é “igualmente eficiente e mais barato”; onde burocratas do governo definem qual o hospital para o qual você deve ir; onde também definem qual o material a ser usado no seu tratamento, independente da sua vontade etc.
Diferentemente de nós, sul-americanos, que via de regra achamos normal depender do Estado, os americanos majoritariamente não crêem no “papai Estado”, não querem que o Estado se intrometa em suas vidas e em seus bolsos, e não confiam nessa história de confiar ao Estado tudo. Ora, depois da atual crise econômica, quando o Estado foi levado a participar mais da economia, só 55,3% da economia dos EUA passaram a ser constituídas pelo setor privado - 44,7% passaram a ser constituídas pelo Estado, sendo 24,1% de participação do governo federal e 20,6% de participação dos governos estaduais e municipais. Imagine, então, com o monopólio do seguro-saúde! A participação pública poderá superar a privada, e isso não é bom, pois nunca na história deu certo o Estado dominar a economia, além de tal mudança significar aumento de impostos para sustentar essa crescente estrutura estatal e mais burocracia governamental intervindo na vida das pessoas.
Ademais, a maioria dos americanos defende algo muito mais sensato: uma reforma menor para atender todos os mais pobres. Os pontos defendidos são:
1) Pessoas com condições pré-existentes devem ser cobertas com seguro-saúde (como o Obamacare defende também);
2) Facilitar o acesso dos pobres não alcançados ao Medicaid;
3) Reformar e regular melhor o Medicare, para melhor servir os idosos, e nada de cortar custos dele como defende o Obamacare;
4) Nada de obrigar a todos pagarem por um seguro-saúde;
5) Medidas para estimular ainda mais a competição entre as companhias de seguro-saúde.
Economistas de renome como Thomas Sowell (que é negro, diga-se de passagem, informação que seria absolutamente desnecessária, mas que acaba sendo importante ser frisada já que comentários sandeus – como o do referido comentarista televisivo tupiniquim mencionado no começo deste artigo – dizem que a oposição ao projeto se dá “por racismo” [Aaarrrgh!]) destacam ainda as fraquezas de um sistema de saúde universal controlado pelo Estado, no qual a maioria esmagadora da população é dependente, como o do projeto de reforma aprovado por Obama.
O economista Paul Krugman, do jornal The New York Times, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2008, ideologicamente ligado ao Partido Democrata e um obamista, tem usado o seu prestígio para defender em artigos a reforma de Obama sob o seguinte argumento, que ele repete exaustivamente: “O Comitê de Orçamento do Congresso concluiu que o projeto de lei proposto reduziria o déficit em 138 bilhões de dólares nos primeiros dez anos e em torno de 1,2 trilhão de dólares na segunda década, o equivalente a 0,5% do PIB americano. Portanto, os custos do projeto não vão quebrar o país. Ele é fiscalmente responsável”. Ora, em primeiro lugar, usar o relatório do Comitê de Orçamento do Congresso dos EUA como prova definitiva de que a reforma não será tão custosa ao cofre americano não é necessariamente convincente. “Por quê?!?” Porque esse mesmo Comitê já disse o mesmo em relação a outros projetos de lei do passado, inclusive o que criou o Medicare nos anos 60, e o que se viu foi exatamente o contrário. O COC é notório em subestimar o custo de desenvolvimento de programas do governo. Mas, deixemos esse detalhe de lado. Consideremos que o COC esteja absolutamente certo. Porém, ainda há um problema: Em segundo lugar, é fácil ser responsável na área fiscal e conseguir custear planos custosos como esse (que vai gastar 1 trilhão de dólares só nos primeiros anos) sem provocar um déficit no PIB, a partir do momento que eu aumento consideravelmente os impostos sobre a população para evitar esse déficit. Praticando isso, qualquer um consegue. Não precisa nem ser um exímio economista para saber disso.
Mas, o Obamacare ainda tem uma multidão de outros problemas, como preferências baseadas na cor da pele, uma enorme restrição de escolhas na hora de usar serviços do plano, eutanásia e tantos outros problemas que estão abrigados nas 1.018 páginas do programa. Repito: 1.018 páginas. Aliás, outro dia vi a Fox News contratando os serviços de um especialista em leitura dinâmica para saber em quantas horas ele conseguiria ler todo o programa do Obamacare. O homem topou e, enquanto a programação da Fox News passava, eventualmente aparecia uma pequena janela na tela mostrando ao vivo o pobre homem suando bicas tentando ler tudo “dinamicamente”, o mais rápido possível. Ele terminou o serviço em pouco mais de duas horas e, claro, sem saber direito o conteúdo que havia lido. A brincadeira foi, notadamente, para criticar a atitude do governo de querer que o programa de 1.018 páginas fosse apreciado e votado em tempo recorde, eliminando "muitas e demoradas discussões". Ou seja, há pontos do Obamacare que nem sequer foram discutidos direito. Aliás, o programa que foi aprovado domingo retrasado foi apenas o primeiro pacote do Obamacare. O segundo ainda entrará em votação no Senado.
Financiamento do aborto passou, sim, senhor!

É mentira que o Obamacare foi aprovado sem o financiamento do aborto! Distorceram por aqui a história. Para conquistar a adesão de parlamentares democratas pró-vida e conseguir aprovar o primeiro pacote do projeto dia 21, Obama precisou recorrer a um engodo de última hora: ele afirmou que assinaria uma ordem executiva proibindo o uso de recursos federais da reforma para pagar abortos. O líder dos pró-vida democratas, Bart Stupak, caiu na conversa e exigiu a ordem executiva para votar a favor da reforma. Só que trata-se da trapaça mais boba do mundo, já que ordens executivas presidenciais não têm poder de lei e podem ser derrubadas na Justiça a qualquer momento, a partir do momento que contrariam uma lei. O que vale como lei é o texto aprovado no Congresso. Basta qualquer pessoa entrar na Justiça com uma ação simples para derrubar essa ordem executiva que contraria o texto da lei aprovada. Aliás, além de isso ser o óbvio ululante para quem entende o mínimo de Direito, há mais de quatro décadas de jurisprudência americana provando ininterruptamente que ordem executivas não têm o poder de mudar o texto de uma lei. Por isso, os democratas "pró-vida" estão sendo chamados agora de flip- flop, ou seja, de falsos pró-vida, de "pró-vida vira-casaca".
Como era de se esperar, várias entidades contrárias ao aborto condenaram o acordo entre os deputados democratas e Obama. Um dos inúmeros protestos foi o do Family Research Council. "Alguns democratas que tinham um histórico de defesa do direito à vida desistiram de seus princípios, confiando no presidente mais pró-aborto já eleito nos EUA e que ainda tem uma secretária de Saúde, Kathleen Sebelius, que é igualmente favorável ao aborto. A traição dos democratas que se diziam 'pró-vida' é um verdadeiro choque", disse Tony Perkins, presidente do Family Research Council. Enquanto isso, várias entidades pró-aborto celebraram a conquista, que faz com que o cristão americano, involuntariamente, financie o aborto ao pagar seus impostos.
Eis Obama: o homem que, com menos de dois dias de mandato, autorizou nos EUA o financiamento de ONGs pró-aborto em qualquer parte do mundo; que autorizou a destruição de embriões para produção de células-tronco embrionárias; e agora assina uma lei em que os cidadãos americanos financiam o aborto com seus impostos. Nada diferente do prometido. Obama já disse, há exatos dois anos, como lembrei à época das eleições americanas, que é a favor do aborto em qualquer fase da gestação e sua colega ideológica Hillary Clinton reiterou esta semana o seu apoio ao aborto financiado pelo governo, posição antiga dela.
Enfim, caro leitor, uma coisa é alguém, mesmo depois de saber todas essas razões aqui apresentadas, ainda apoiar a reforma da saúde proposta por Obama, porque considera que, apesar de todos esses pontos seriamente preocupantes, é-lhe preferível ainda submeter-se a todo esse sistema proposto (como acreditam 39% dos americanos), porque não acha aborto, eutanásia, aumento de impostos e monopólio do governo na área de seguro-saúde nada demais; outra coisa totalmente diferente – e incoerente – é alguém omitir essas razões sérias pelas quais a tal reforma é vista com preocupação pela maioria da população e ainda cometer a ofensa (à sua e à minha lógica) de dizer que a oposição da população americana a ela se deve a “racismo e egoísmo”.
É preciso uma reforma no sistema de saúde americano? Sem dúvida, ninguém nega. Mas, como 59% dos americanos – justamente pelas razões acima elencadas –, eu não concordo que a melhor forma seja essa proposta por Obama, que fere, inclusive, direitos do cidadão americano, além de valores morais, valores inegociáveis.