sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Cinco critérios básicos para identificar um teólogo liberal nos dias de hoje (e que cabem, alguns deles, também na identificação de outros desvios)

(A bela charge que abre este artigo é uma obra do meu amigo Flamir Ambrósio. Ela foi publicada originalmente em edição recente do jornal Mensageiro da Paz)
Há muitas formas de identificar teólogos liberais nos dias de hoje, mas gostaria de frisar apenas cinco critérios que acho essenciais para essa identificação (acrescentando que alguns deles também cabem em outros tipos de desvios doutrinários além do liberalismo teológico).
1) Um teólogo liberal vez por outra confunde doutrinas bíblicas com opiniões pessoais e trata doutrinas fundamentais da mesma forma que são tratadas as doutrinas secundárias. Ele ou não enxerga ou despreza essa diferença entre as doutrinas bíblicas. Por quê? Devido à sua obsessão que o cega. Mas que obsessão? Veja o ponto seguinte.
2) Um teólogo liberal sempre está em busca de uma “revolução teológica”, do ineditismo, chegando ao ponto de ultrapassar limites bíblicos claros em busca desse "ineditismo revolucionário", quando o que as igrejas precisam mesmo é de um resgate da verdadeira Teologia.
Não é preciso abrir novos poços, os que já temos são suficientes. E únicos. Basta desentulhá-los para voltarem a jorrar e saciar a sede. A Bíblia diz que quando Isaque estava sem água, não abriu novos poços, mas apenas desentulhou os poços que seu pai Abraão abrira no passado. Se tentarmos abrir novos poços, teremos que fazê-lo longe daqui, isto é, longe do terreno bíblico, e essa é uma atitude tresloucada, porque é apoiado sobre as Sagradas Escrituras que deve viver o cristão. E além disso, os poços abertos fora do terreno bíblico, quando dão água (quando dão!), são águas turvas, águas que contaminam e matam.
Para ser um teólogo relevante não é preciso "inventar a roda", procurar obsessivamente a originalidade, produzir uma nova teologia mesmo que esta choque-se frontalmente com a Palavra de Deus. É preciso, sim, voltar-se para as cisternas da Palavra, desentulhá-las (quando os inimigos se levantarem para estorvá-las), beber de suas águas cristalinas e dá-las ao povo.
3) Um teólogo liberal, ao tentar podar as pontas de um galho (ou sob o falso pretexto de fazê-lo) acaba cortando todo o galho. Às vezes, o galho está precisando ser podado mesmo. Em alguns momentos, há pontos que necessitam realmente ser aparados doutrinariamente. Porém, sob o falso pretexto de fazer isso ou em um arroubo cego, o teólogo liberal corta tudo fora, vai além da conta, joga fora o essencial junto com o pernicioso. Joga fora a água suja da bacia juntamente com o bebê.
4) Um teólogo liberal coloca a filosofia acima da Palavra de Deus. Entenda que não estamos dizendo aqui que a razão é um obstáculo à crença ou que a razão e a fé se opõem uma à outra. A fé, de acordo com a Bíblia, é um ato de pensar e, como já disse alguém, todo problema de quem tem uma fé pequena consiste exatamente em não pensar.
Quem opta por uma espiritualidade que despreza a razão termina por ou esmorecer na fé ou desaguar em sandices, bizarrias, loucuras.
De maneira alguma devemos pensar que a fé é algo meramente místico, divorciado da razão. A Bíblia está repleta de lógica. O culto a Deus, por exemplo, diz a Bíblia, deve ser “racional” (Rm 12.1,2). E como bem definiu C. S. Lewis, “a fé é a arte de admitir as coisas que a razão já aprovou, apesar da mudança de ânimo”.
Em Isaías 1.18, Deus assevera claramente que a razão é importante para Ele e para a fé, pois conclama Seu povo a “arrazoar” com Ele, isto é, pensar e argumentar com Ele. Conversar com Deus exige o ato de pensar. Enquanto a meditação oriental prega o esvaziamento da mente, a meditação bíblica, muito pelo contrário, consiste numa reflexão séria sobre o que o texto bíblico está falando conosco.
Portanto, fé e razão não são opostas.
Porém, à luz da Bíblia, aprendemos também que a fé muitas vezes ultrapassa a razão. Ela não a deprime, mas ultrapassa-a. Isso porque, como criaturas que somos, nunca podemos compreender perfeitamente as coisas espirituais, a não ser por fé. Por isso, quando a razão resolve sair de seu lugar e entrar numa esfera que não é sua, quando ela tenta suplantar a fé, acaba virando loucura. A razão só pode alçar altos vôos com segurança se atrelada à carruagem da fé.
A verdadeira fé nunca despreza, oprime ou esmaga a razão; ela eleva a razão a vôos muito maiores. Se a razão se rebela diante da verdadeira fé, ela se auto-destrói afogando-se na multidão de argumentos de seu narcisismo. A razão humana, por si mesma, nunca sondará o insondável. Ela só poderá tanger um pouco do insondável pelo auxílio do Espírito Santo, que só opera onde há a fé verdadeira.
Aliás, é importante frisar aqui que, quando refiro-me à fé ou à verdadeira fé em todo esse texto, obviamente não estou falando de fé no sentido genérico, mas de fé bíblica, fé que tem por base as Sagradas Escrituras. Essa é a fé verdadeira.
A Bíblia alerta-nos para o perigo de colocarmos a filosofia acima das Escrituras, isto é, de pensarmos que a razão por si mesma é o suficiente para tudo, que a razão não precisa da fé. Repito: a razão, sem a verdadeira fé, torna-se loucura e, por isso, embriagada em sua sandice, interpreta a fé como loucura, acha que ela é que é loucura. Está escrito: “Se alguém dentre vós se tem por sábio neste mundo, faça-se louco para ser sábio” (1Co 3.18). A expressão “louco” aqui significa não confiar totalmente e acima de tudo na filosofia, e não desprezar a verdadeira fé. Um teólogo liberal sempre é alguém que faz exatamente o contrário.
5) Finalmente, um teólogo liberal sempre invoca um discurso piedoso como justificativa para seu erro. Ele consegue achar normal justificar um erro doutrinário crasso usando o manto de uma falsa piedade e de um falso amor. Ele tenta desonestamente colocar o amor em oposição à doutrina bíblica, fazendo com que seus seguidores não percebam a loucura que estão fazendo, já que não existe verdadeiro e pleno amor onde há desprezo à Palavra de Deus.
Isso é uma estratégia antiga. Paulo já dizia que alguns em sua época ensinavam heresias, mas, mesmo assim, eram considerados corretos por alguns incautos, tudo porque portavam uma aparência de piedade. “Ninguém vos domine a seu bel-prazer, com pretexto de humildade (...) estando debalde inchado na sua carnal compreensão” (Cl 2.18).
A única diferença daqueles falsos mestres da época paulina para os teólogos liberais de hoje é apenas o tipo de bizarria doutrinária. A estratégia, contudo, é a mesma.
Como vemos, não há mesmo nada novo debaixo do sol. Já dizia Salomão.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

A Parábola da Grande Montanha

Era uma vez um grupo de alpinistas cujo objetivo era escalar a Grande Montanha. Esses alpinistas, porém, queriam fazê-lo de forma diferente dos demais. Ora, até aquele dia, todos os que tinham conseguido escalar com segurança a Montanha, chegando ao seu cume, tinham seguido um manual escrito por várias antigos alpinistas que, depois de suas longas experiências com a Montanha, foram orientados por Ela (sim, a Montanha) a descreverem-na para a posteridade por meio desse Manual. Essas orientações colocadas no Manual foram ditadas pela própria Montanha àqueles primeiros alpinistas, porque Ela queria ser escalada por todos os alpinistas e então explicou com prazer como fazê-lo com segurança. Mas não revelou tudo sobre si mesma. Só o essencial para a escalada segura.
Assim, os primeiros alpinistas registraram apenas os detalhes suficientes para qualquer outro alpinista que viesse depois deles pudesse conhecer bem a Grande Montanha o suficiente para escalá-la sem problemas. Todos que seguiam o Manual se maravilhavam como ele era preciso e, ao segui-lo à risca, no meio da trajetória, tinham suas próprias experiências com a Grande Montanha, decorrentes da obediência às orientações do Manual. Alguns destes resolveram depois até escrever sobre o Manual, dizendo o quanto ele era perfeito e indicando os pontos favoritos deles no Manual, bem como aqueles pontos que consideravam de grande importância. Escreveram seus guias do Manual. Porém, esses alpinistas faziam questão de frisar que seus livros eram só um auxílio para as pessoas que queriam estudar o Manual, e que o mais importante mesmo era as pessoas estudarem o Manual e seguirem-no ao pé da letra em sua escalada.
Além disso, apesar de para uns alguns pontos favoritos não serem os mesmos para outros, e alguns pontos considerados importantes não o serem para todos, todos que seguiam o Manual eram de comum acordo de que (1) o Manual era perfeito e que (2) havia alguns pontos bem específicos do Manual que eram, sem dúvida, fundamentais, indispensáveis, os mais importantes de todos os pontos do Manual. Com esses pontos específicos, todos concordavam, todos eram de comum acordo. Ao ponto de dizerem que, se esses pontos não fossem observados pelos alpinistas, poderiam levá-los a um desastre. Aliás, isso era até muito fácil de entender, já que no próprio Manual havia essa orientação sobre a importância e a indispensabilidade desses pontos específicos.
Porém, os alpinistas novos não levaram a sério essa recomendação e começaram a escalada desprezando muitos pontos fundamentais do Manual, valorizando só aqueles que lhes pareciam importantes. E alguns deles nem se importavam mesmo com o Manual. Diziam que o mais importante era curtir a escalada sem se importar com as regras do Manual de escalada, mesmo que o próprio Manual dissesse que havia pontos dele que não poderiam ser desprezados, pois eram orientações fundamentais deixadas pela própria Montanha. Alguns desses novos alpinistas chegaram até a propor uma revisão na interpretação sobre quais pontos seriam mesmo os mais fundamentais. E se alguém lhes alertava do perigo de fazerem isso, diziam que essas pessoas estavam influenciadas pelo que diziam os livros sobre o Manual que haviam sido escritos.
Entretanto, no final das contas, aqueles novos alpinistas se perderam na escalada. Mesmo assim, orgulhosos, alguns deles propuseram a seguinte explicação: "Na verdade, quem disse que esse não é o caminho certo para o cume da Grande Montanha?" Ao que alguém replicou: "Mas pelo Manual não parece ser?" Ao que responderam: "E quem disse que os alpinistas que escreveram esse Manual entenderam direito quando a Grande Montanha disse como era o Seu cume e como chegar a ele? Eles podem ter se confundido. Deve haver contradições no Manual, já que quem o escreveu foram alpinistas diferentes em épocas diferentes que puderam ter entendido as palavras da Grande Montanha de forma diferente. As únicas coisas que o Manual diz do qual podemos estar seguros é que isto é mesmo a Grande Montanha e ela tem um cume. Só isso. No mais, é curtir a escalada sem ficar muito preso a interpretações literalistas acerca do que diz o Manual sobre o caminho para o cume. E mesmo que isso aqui não seja o caminho certo para o cume, tenho certeza de que ainda estamos em direção a ele e já já chegaremos ao cume".
E todos ficaram à vontade naquele lugar pensando que estavam no caminho certo para o cume ou, pelo menos, a meio caminho para achá-lo. Alguns alpinistas que passavam por perto dali até alertaram aqueles alpinistas "muito inteligentes" que desprezavam os que eram literalistas no entendimento do Manual. Porém, aqueles alpinistas "muito inteligentes" não deram bola para eles.
"O quê? Isso aqui não é o caminho para o cume nem a direção certa para ele? Que nada! Quem disse que estamos errados? O Manual? Vocês é que ficam muito presos a uma interpretação literalista do Manual. Estão influenciados por esses livros sobre o Manual que escreveram tempos atrás. Lembrem-se que esses guias discordam entre si em alguns pontos! Nada garante que vocês estão certos. Além do mais, estamos bem aqui!"
Alguém até explicou: "Mas todos que conhecem o Manual concordam que vocês estão no caminho errado. Isso porque trata-se de um erro fundamental, não de pontos secundários do Manual. Aliás, leiam o Manual! Ele é claro quanto a isso. Por exemplo, no capítulo..."
"Não! Não me venha com essa! Nós conhecemos bem o Manual! Continuem seus caminhos e deixem a gente curtir a escalada do jeito que a gente bem entende."
E por ali ficaram. Até quando, ainda não se sabe.

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Conheça as frágeis justificativas de Greg Boyd (um dos maiores defensores do Teísmo Aberto) para tentar sustentar seus erros doutrinários nos EUA

O texto que analisamos a seguir foi preparado anos atrás pelo pastor e teólogo Gregory Boyd, defensor do Teísmo Aberto, por ocasião de uma Conferência Geral Batista nos EUA, quando foi questionado sobre seus ensinos. Naquela oportunidade, apesar da pressão dos batistas para que fosse excluído de sua denominação (exatamente por causa do TA), ele conseguiu permanecer nela. Mas viu a membresia da igreja a qual dirigia diminuir quase 25% depois de denunciadas suas heresias. Veja as respostas dele às objeções que lhe foram feitas naquela conferência e nossa análise sobre cada uma das respostas de Boyd (sua defesa foi traduzida por Paulo César Antunes e pode ser encontrada também no site www.arminianismo.com).
Objeção 1: A visão aberta mina a onisciência de Deus
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) que Deus absolutamente conhece todas as coisas. Não há nenhuma diferença em meu entendimento da onisciência de Deus e do de qualquer outro teólogo ortodoxo, mas eu defendo que parte da realidade que Deus perfeitamente conhece consiste de possibilidades assim como de realidades. A diferença está em nosso entendimento da natureza do futuro, não em nosso entendimento da onisciência de Deus.
Análise: Boyd afirma que Deus conhece absolutamente todas as coisas. Porém, o que diz a seguir contradiz absolutamente sua primeira afirmação. A partir do momento que ele afirma que o futuro que Deus conhece consiste não só de realidades, mas também de possibilidades, ele está dizendo que Deus não sabe de tudo.
Diz Boyd que há coisas no futuro que para Deus são apenas possibilidades, o que significa que Deus não saberia exatamente onde essas determinadas coisas vão dar. Ele as descobriria aos poucos (o que o TA chama, numa tentativa tresloucada de tentar mostrar que ainda crêem na onisciência divina, de “onisciência em movimento”; tal “onisciência” está em contraposição à verdadeira onisciência, que o TA chama de “estática”). Para Boyd, Deus teria que esperar para ver o que realmente vai acontecer em alguns casos específicos. Porém, não é isso que a Bíblia ensina (e mais à frente vamos citar textos que mostram claramente isso). Antes, porém, detenhamo-nos um pouco mais na fragilidade dessa afirmação de Boyd.
Ao dizer que o problema não é a definição de onisciência, mas a definição de futuro, Boyd tenta camuflar sua descrença na onisciência de Deus. O problema mesmo dele é com a onisciência, mas, infelizmente, ele não é honesto para afirmar isso. Desonestamente, joga com as palavras para confundir os desatentos.
É simples: quando digo que para Deus o futuro está cheio de possibilidades (como acontece com o homem), já estou partindo do princípio de que Deus não é onisciente. Não posso mexer numa coisa sem deixar de afetar a outra. Na verdade, o que Boyd está dizendo é o seguinte absurdo: “Não estou dizendo que Deus não sabe de tudo; estou dizendo que nem todo o futuro é conhecido por Ele”. Ora, Boyd, se você está dizendo que todo o futuro não é conhecido por Deus, logo está dizendo que Deus não é onisciente!
Em alguns momentos, em seus livros e artigos, Boyd repete que acredita que Deus é onisciente e, ao mesmo tempo, diz que não acredita que “essa onisciência seja plena ou exaustiva”. Ora, o termo onisciente significa “aquele que sabe de tudo”. O prefixo “oni” determina plenitude e exaustão nesse conhecimento. Logo, dizer que alguém “não é plenamente onisciente” ou “não é exaustivamente onisciente” é dizer que esse alguém não é onisciente, porque se não é pleno, se não é exaustivo, não é “oni”. Então, é ilógico dizer “creio na onisciência divina” e ao mesmo tempo “não creio que essa onisciência seja exaustiva”. O pior de tudo é saber que há pessoas inteligentes que conseguem ler uma declaração absurda dessas sem notar o erro de lógica crasso que reside nela.
Bem, mas vamos aos textos bíblicos. Isaías 46.10 e Salmos 139.1-18 (especialmente os versículos 2 a 4) são os textos mais conhecidos dentre os que afirmam claramente a onisciência de Deus (o conhecimento exaustivo de Deus em relação a todas as coisas passadas, presentes e futuras), mas gostaria de destacar ainda Hebreus 4.13 e Salmos 31.15 e 147.5. O primeiro texto diz: “E não há criatura alguma encoberta diante dEle; antes, todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar”. Detalhe: o vocábulo usado no original grego nesta passagem e traduzido por “patentes” é o mesmo utilizado para descrever um lutador imobilizado pelo seu oponente. Ou seja, o termo traz a idéia também de submissão total. Logo, o que o escritor da Epístola aos Hebreus quis dizer mais profundamente é que todas as coisas e acontecimentos (futuros, passados e presentes) não são apenas totalmente conhecidos por Deus, mas também totalmente submissos a Ele. E isso é confirmado no segundo texto: “Os meus tempos [passado, presente e futuro] estão nas Tuas mãos” (Sl 31.15).
Portanto, os acontecimentos passados, presentes e futuros estão todos sob o controle divino; Ele os conhece e é Ele quem permitiu que os acontecimentos passados se tornassem realidade e permite que os acontecimentos presentes e futuros se tornem realidade. Logo, não há acontecimentos futuros que sejam hoje só possibilidades para Deus, mas todos os acontecimentos futuros são realidades já conhecidas por Ele, pois é Ele que os permite (dentro de Sua vontade absoluta ou permissiva).
Finalmente, o terceiro texto diz: “Grande é o nosso Senhor, e de grande poder; o seu conhecimento é INFINITO” (Sl 147.5). Ora, o futuro para nós é apenas um conjunto de possibilidades com só algumas certezas que temos por fé em Deus e na Sua Palavra. Mas para Deus, não. O Seu conhecimento é infinito!
O Senhor não manipula nossas decisões, mas Ele já sabe o que nós, pelo nosso livre arbítrio, decidiremos a seguir e administra nossas decisões livres conforme Sua vontade absoluta e Sua vontade permissiva. Ou seja, à luz da Bíblia, para Deus, o futuro já é todo realidade, não meio-realidade e meio-possibilidade.
Objeção 2: A visão aberta mina a onipotência de Deus
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) que Deus é onipotente. Ele é o Criador de todas as coisas e por isso todo poder deriva dele. Como todos os arminianos, eu também defendo que Deus limita o exercício de seu próprio poder para conceder livre-arbítrio àqueles que ele criou à sua própria imagem.
Análise: Em primeiro lugar, Deus não é todo-poderoso simplesmente porque todo poder deriva dEle. Pela lógica que Boyd sugere, Deus não seria na verdade todo-poderoso ao pé da letra; Ele seria apenas a fonte dos poderes que existem. Dizer que Deus é “todo-poderoso” para Boyd significaria apenas isso. Porém, a Bíblia diz que Deus é todo-poderoso porque (1) tudo está sob o controle divino e (2) ninguém pode impedir Deus quando Ele deseja operar. Ninguém! É só ler Gênesis 17.1; Jó 42.2; Lucas 1.37; Isaías 43.13; 2Crônicas 20.6 e Daniel 4.35.
Em segundo lugar: Quem disse que o arminianismo afirma que o fato de Deus criar os seres humanos com livre arbítrio significa necessariamente que Deus limitou a Sua onipotência? É o velho hábito dos teístas abertos de tentarem camuflar seus erros colocando-os desonestamente na conta do arminianismo.
Para os arminianos, Deus é mesmo onipotente, Ele tem mesmo todo o poder. Deus não limita o Seu poder por causa do livre arbítrio humano. Se fosse o livre arbítrio que salvasse, alguém poderia dizer que Boyd está certo, mas quem salva é Deus. O homem não é salvo pelo seu livre arbítrio. Este apenas possibilita-o escolher ou não a salvação que só Deus poderá efetuar em sua vida (Mt 19.25,26). E se o homem não escolhe a salvação do Onipotente, ele se perde eternamente. A vontade de Deus, em nenhum momento, se submete ao livre arbítrio humano. Nem na oração isso acontece (1Jo 5.14). O ser humano, em seu livre arbítrio, é que deve escolher a vontade divina, se não, ao final, sofrerá as conseqüências de sua decisão e nada que o homem venha a fazer posteriormente poderá reverter isso. Será sofrimento eterno. Portanto, é errado ver o livre arbítrio como uma limitação da onipotência divina, posto que o homem, dentro do seu livre arbítrio, não pode mudar Deus e, se for contra Deus, sofrerá por isso.
Objeção 3: A visão aberta mina nossa confiança na capacidade de Deus para cumprir seus propósitos
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) que Deus pode e garantiu tudo que quis sobre o futuro, visto ser ele onipotente. Eu também afirmo (porque a Escritura também ensina) que Deus nos criou com a capacidade para amar, e por isso nos capacitou a tomar decisões de algumas questões por nós mesmos. Dentro dos parâmetros estabelecidos pelo Criador, parâmetros que garantem tudo que Deus quer garantir sobre o futuro, os humanos têm algum grau de auto-determinação. Isso significa que em relação ao destino dos indivíduos particulares as coisas podem não se mostrar como Deus deseja. Se negarmos isto, devemos aceitar que Deus na verdade deseja que algumas pessoas vão para o inferno. A Escritura nega isso (1Tm 2.4; 2Pe 3.9).
Análise: Aqui há uma meia verdade. Há a vontade absoluta de Deus e a vontade permissiva de Deus, e dentro desta última o ser humano pode tomar decisões particulares. Aí tudo bem. Os problemas estão apenas em dois pontos.
Primeiro, no fato de que a concepção de Deus do Teísmo Aberto – que apresenta Deus como não sendo onipotente (não tem todo o poder) nem onisciente (não sabe de tudo) – afeta mesmo a garantia de que Deus cumprirá tudo que diz. E o argumento que Boyd usa para dizer que isso não é verdade simplesmente não tem nada a ver com o assunto. A capacidade que Deus dá aos homens de tomarem decisões particulares não significa limitação no poder de Deus. Isso porque essas decisões particulares, fruto do livre arbítrio, não são realizadas fora da vontade de Deus, mesmo aquelas decisões que ofendem a santidade divina. Elas são realizadas dentro da vontade permissiva de Deus. Logo, Deus está no controle, Ele administra essas ações. Ele não as provocou (no caso das decisões pecaminosas), não as incentivou, não se agrada delas, mas Ele soberanamente as administra. Essas ações livres do homem não limitaram Seu poder porque estão todas elas sujeitas ao Seu poder e cada uma delas terá sua recompensa segundo o Seu poder.
Por sua vez, o segundo problema está na confusão que Boyd faz entre o desejo de Deus que todos se salvem e a onipotência divina.
O fato de o ser humano ter o livre arbítrio para rejeitar a salvação oferecida por Deus não significa que Deus, portanto, não teve o poder para salvar o ser humano (logo, Ele não seria onipotente ou, como dizem os teístas abertos, cometendo um erro de lógica, “não seria plenamente onipotente” [ora, se não é pleno já não é “oni”]). Deus pôde e pode salvar, o ser humano é que muitas vezes não quer a salvação divina e sofrerá por isso. A onipotência divina não é afetada (ou “limitada”, como dizem os teístas abertos) pelo livre arbítrio quando o ser humano recusa Deus. Ao pensar o contrário, os adeptos do Teísmo Aberto, que se dizem tão arminianos, estão usando, na verdade, uma lógica calvinista.
Muitos calvinistas argumentam exatamente assim: “Se o ser humano pode resistir, logo você está dizendo que Deus não tem o poder de salvar”. Porém, na verdade, porque o livre arbítrio permite ao homem recusar a salvação, isso não significa que o livre arbítrio implica na limitação do poder de Deus. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas o que os teístas abertos dizem é o mesmo que muitos calvinistas afirmam: que tem a ver sim. Sendo que, no caso dos calvinistas, ao criarem esse problema claramente desnecessário, eles o eliminam dizendo que o livre arbítrio simplesmente não existe, que o livre arbítrio é um “escravo”, e que o que existe mesmo é apenas uma “livre agência” que Deus deu ao homem. Já os teístas abertos resolvem o “problema” criando um verdadeiro PROBLEMA, diminuindo os atributos de Deus, diminuindo Deus, chocando-se frontalmente com a doutrina bíblica; enfim, fazendo com que Deus deixe de ser Deus.
Objeção 4: A visão aberta mina a perfeição de Deus
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) a absoluta perfeição de Deus. Eu não vejo, entretanto, que a Escritura ensina que o futuro deve ser predeterminado, ou na mente de Deus ou em sua vontade, para Deus ser perfeito. Antes, creio que a perfeição de Deus é mais exaltada quando o entendemos ser tão transcendente em seu poder a ponto de genuinamente conceder livre-arbítrio aos agentes moralmente responsáveis.
Análise: Ora, esse é outro dos tremendos assaltos à lógica que o Teísmo Aberto pratica. O que faz Deus ser Deus, perfeito, são justamente seus atributos, que são únicos e O distinguem de todos os outros seres. Se Deus não é mais onipotente e onisciente, logo Ele não é mais perfeito. Além disso, outra vez Boyd, desonestamente, tenta vincular o Teísmo Aberto ao genuíno arminianismo, ao dizer que Deus, ao conceder o livre arbítrio, estava automaticamente limitando Seu poder e limitando Seu conhecimento. Como já vimos, o livre arbítrio do homem não implica nem em uma coisa nem em outra.
Objeção 5: A visão aberta mina a força da oração
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) que a oração petitória é nossa mais poderosa ferramenta para realizar a vontade do Pai “na terra como no céu.” Realmente, pelo fato de minha concepção permitir que o futuro seja um tanto aberto, creio que faz mais sentido por causa da urgência e eficácia que a Escritura atribui à oração.
Análise: O nosso relacionamento com Deus não muda Deus, não altera-o conforme nossa vontade. Para o Teísmo Aberto, as ações e orações do homem afetam Deus no sentido de fazer com que a vontade dEle seja alterada. Mas não é isso que a Bíblia diz. A oração, em nenhum momento, altera a vontade de Deus. Ela é que nos leva à vontade de Deus, quando oramos com nosso coração aberto, humilde e sinceros diante do Senhor. A Bíblia diz que Deus só atende à oração que é feita segundo a Sua vontade (1Jo 5.14). A oração não muda a vontade de Deus.
O texto que Boyd usa em seu favor vai exatamente contra seu ensinamento. Jesus, na Oração do Pai Nosso, ensinou que devemos orar para que seja feita a vontade de Deus na Terra “assim como no Céu” (Mt 6.10). Ou seja, Ele estava ensinando que a oração não é para que seja feita no Céu a nossa vontade na Terra, mas para que seja feita na Terra a vontade do Céu, a vontade de Deus. Um exemplo: 2Crônicas 7.14. Nessa passagem, está claro que quando nós mudamos, aceitando a vontade de Deus para nossas vidas, Deus nos abençoa. Não é Deus que muda Seu comportamento em nosso favor, nós é que mudamos nosso comportamento em relação a Ele, nos convertemos a Ele, buscamos a Sua presença, e então Ele, que sempre quer nos abençoar, nos abençoa. Por isso costumo dizer que Deus está mais interessado em nos abençoar do que nós em sermos abençoados por Ele. A questão é nosso comportamento, não Deus.
Objeção 6: A visão aberta não pode explicar a profecia bíblica
Eu afirmo (porque a Escritura ensina) que Deus pode e determina e prevê o futuro sempre que for adequado aos seus soberanos propósitos agir assim. Mas eu nego que isto logicamente requer, ou que a Escritura ensina, que o futuro seja exaustivamente determinado. Deus é sábio o suficiente para ser capaz de cumprir seus propósitos enquanto concede às suas criaturas um grau significativo de liberdade.
Análise: Sobre a primeira parte dessa afirmação, a verdade é que o futuro pode não ser exaustivamente determinado, mas é exaustivamente conhecido por Deus, e todas as livres ações dos seres humanos que Deus permite pela Sua vontade são administradas por Ele para que não firam seus propósitos eternos.
Quanto à segunda parte da afirmação de Boyd, já falamos mais acima sobre a falácia do argumento que encontramos aqui. A liberdade de escolha do homem não tem nada a ver com limitação de poder ou de conhecimento de Deus.
Objeção 7: A visão aberta é incoerente
Alguns argumentam que é logicamente impossível para Deus garantir aspectos do futuro sem controlar tudo sobre o futuro. Esta objeção tem sido levantada pelos calvinistas contra os arminianos por séculos e não é mais poderosa contra a visão aberta do que contra os arminianos clássicos. Tudo na vida, da nossa experiência pessoal às partículas quânticas, aponta para a verdade de que o eqüilíbrio previsível não exclui um elemento de imprevisibilidade.
Análise: Já falamos sobre a falácia desse argumento também. Pelo menos aqui Boyd, de passagem, assume que o Teísmo Aberto não tem nada a ver com o verdadeiro arminianismo, cuja única coisa que tem a ver com essa história toda é ter o desgosto de ver que o TA surgiu em seu meio. O TA não é arminianismo. É distorção do verdadeiro arminianismo.
Só um detalhe: Deus controla tudo sobre o futuro? Sim. Tanto os calvinistas quanto os arminianos concordam com essa afirmação, sendo que a interpretam de forma diferente; já o Teísmo Aberto não concorda com essa afirmação. Mas, à luz da Bíblia, Deus administra as ações livres dos seres humanos.
Quanto a essa história de relacionar física quântica com a Bíblia, brevemente estarei escrevendo sobre esse assunto. Aguardem.
Objeção 8: A Escritura usada para apoiar a visão aberta pode ser interpretada como antropomorfismos fenomenológicos
Esta declara que estas passagens são uma maneira humana de falar sobre coisas que parecem ser não como elas verdadeiramente são. Entretanto, nada no contexto destas Escrituras, cobrindo uma variedade de públicos, autores e contextos, sugere que sejam. Não há nenhuma razão para ler nestas descrições das ações de Deus qualquer coisa diferente da que sua mais natural explicação. Como podem relatos sobre o que Deus estava imaginando ser fenomenológicos (Jr 3.6,7; Jr 19-20; Êx 33.17)? E do que eles seriam considerados como antropomórficos?
Análise: O “arrependimento” de Deus trata-se, sim, de uma linguagem antropomórfica para explicar a relação de Deus com o homem. Não significa dizer que Deus é como o homem. A própria Bíblia nega isso contundentemente (Nm 23.19). O antropomorfismo é um recurso lingüístico milenar que foi usado não só na Bíblia. Inclusive, nas Sagradas Escrituras encontramos muitos outros recursos lingüísticos antiqüíssimos. Desprezar esse fato é forçar uma contradição na Bíblia (compare 1Samuel 15.10,11 com 15.39, por exemplo). É claro o uso desse recurso nas Sagradas Escrituras. Não se trata de um critério usado ao bel prazer, só em algumas passagens, para atender ao gosto do intérprete da Bíblia (como dizem Boyd e outros). Não perceber esse recurso claro no texto bíblico não só é desonesto como força uma interpretação de Deus que choca-se frontalmente com todo o resto do que a Bíblia diz sobre Ele.
Arrependimento significa “mudança de atitude”. Ora, quando a Bíblia diz, em linguagem antropomórfica, que “Deus se arrependeu”, está afirmando, portanto, que Ele, por causa de nossa mudança de atitude diante dEle, mudou Sua ação sobre nós, não Sua vontade.
Deus não muda. Ele continua sendo o que sempre disse que era. Nós é que muitas vezes deixamos de ser ou fazer e, à medida que mudamos, Sua ação sobre nós também muda. Não Sua vontade. Deus está sempre no mesmo lugar, nós é que nem sempre estamos no mesmo lugar onde Ele está (Sua vontade). Ele não muda, nós é que mudamos e sofremos as conseqüências naturais disso. Suas ações mudam na medida em que nós saímos do lugar em que Deus sempre esteve e nunca vai sair (Ml 3.6). E os textos que Boyd cita não contradizem isso. No último texto bíblico citado, lembremos que todas as orações de Moisés que Deus atendeu foram dentro da Sua vontade, não contra a Sua vontade.
Objeção 9: A visão aberta diminui a soberania de Deus
Pelo contrário, ela exalta a soberania de Deus. Após descrever um iminente julgamento, o profeta Joel afirma, “Ainda assim, agora mesmo diz o SENHOR: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, e com choro, e com pranto. E rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao SENHOR vosso Deus; porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e se arrepende do mal. Quem sabe se não se voltará e se arrependerá, e deixará após si uma bênção...” (Jl 2.12-14).
Análise: Bem, já vimos que não exalta. Pelo contrário, diminui Deus. E o texto que Boyd cita não o ajuda. A interpretação desse texto é clara e pode ser feita facilmente à luz do que já explicamos principalmente nas análises às respostas dele às objeções 5 e 8.
Como vemos, os argumentos de Boyd são um exemplo clássico de como um discurso envernizado e com tom piedoso pode esconder terríveis erros doutrinários e de lógica que só enganam os mais desatentos. Sejamos como os bereanos (At 17.11).

domingo, 19 de agosto de 2007

Abraham Kuyper: o homem que dedicou sua vida à luta por uma igreja viva e à defesa e proclamação dos valores cristãos na sociedade do século 19

Pastor, teólogo, professor, estadista e jornalista, Abraham Kuyper foi um dos maiores nomes da Igreja no século 19. Sobre ele afirmou reverendo Martin Lloyd-Jones: “Sua obra se ergue como um monumento da única oposição verdadeira a toda idéia por trás da Revolução Francesa” (Isso porque a Revolução Francesa criou sua própria religião: o chamado "culto à razão", onde Deus era rechaçado. E essa onda, infelizmente, acabou afetando também a Teologia, fazendo aflorar o liberalismo teológico).
Na época do nascimento de Kuyper, o racionalismo anticristão começava a influenciar fortemente a Holanda, antes considerada uma fortaleza da fé bíblica (Hoje, então, não há nem sombra disso lá). Só para se ter uma idéia de como estava a coisa, os próprios interesses políticos do período favoreciam essa influência. O rei William I chegou a favorecer a teologia liberal nas faculdades holandesas para enfraquecer a doutrina da Igreja Reformada e, assim, controlá-la. Foi nesse contexto que nasceu Kuyper, mais exatamente em 1837, em Maassluis, na Holanda, filho de um pastor. Ele formou-se doutor em Teologia na Universidade de Leiden em 1862. Ma isso não significa que nessa época ele estava bem. Em Leiden, o jovem Kuyper absorveu idéias antibíblicas.
Sobre esse período, diria depois: “Em Leiden, estava entre os que aplaudiram calorosa e ruidosamente quando nosso professor manifestou sua ruptura total com a fé na ressurreição de Cristo. Hoje, minha alma treme por causa da desonra que outrora infligi a meu Salvador”. Mesmo incrédulo, aceitou ser ordenado pastor de uma congregação em Beesd, povoado de Gelderland, onde ficou por quatro anos. Foi ali que se converteu.
Os membros de sua igreja, crentes fervorosos, o levaram à fé viva na Bíblia. Entre eles, a jovem camponesa Pietje Baltus. Ela fazia objeções à pregação de Kuyper, testemunhava sobre o poder transformador do Evangelho na sua vida e incentivava o líder a estudar pormenorizadamente as confissões de fé e determinados textos bíblicos. Foi nesse estudo que Kuyper rendeu-se a Cristo e compreendeu a fragilidade dos argumentos da teologia liberal.
Em 1870, Kuyper mudou-se para Amsterdã para se tornar pastor da famosa Igreja de Nieuwekerk. Ali, um milagre aconteceu: aquela cidade, antes baluarte da teologia liberal, foi avivada pela pregação do jovem pastor. Conta-se que multidões afluíam para ouvi-lo defender apaixonadamente a ortodoxia bíblica. Assim, Kuyper tornou-se o mais notório líder da ala ortodoxa da Igreja Reformada Holandesa, trabalhando por uma igreja livre do controle do Estado. Mas, como não ocorriam as mudanças devido à oposição dos adversários, cerca de 200 congregações, num total de 170 mil crentes, formaram, em 1886, “A Igreja dos Tristes”, assim chamada porque esses cristãos foram forçados, pelas circunstâncias, a retirar-se de suas igrejas. Foi uma cisão triste, mas necessária para a época.
Kuyper escreveu livros e artigos sobre Teologia, Filosofia, Política, Arte e questões sociais, expressando sempre um conceito cristão de mundo. Aliás, ele é considerado, ao lado de Francis Schaeffer, o pai do estudo da cosmovisão cristã.
Por entender que a educação teológica é da maior importância e em resposta ao liberalismo que invadira as faculdades, Kuyper fundou a Universidade Livre de Amsterdã. Quando ela iniciou suas atividades em 1880, ele declarou no discurso inaugural: “Quando nos omitimos na esfera educacional, deixando que Satanás proclame suas filosofias abertamente e sem contestação, estamos fazendo justamente o que Deus não permite: deixamos que sua glória seja dada a outrem”.
Justamente por também acreditar que “toda verdade vem de Deus”, Kuyper não criou um simples curso de Teologia, mas uma universidade onde todos os currículos, artes e ciências eram parte de uma cosmovisão bíblica. Ele lecionou ali Teologia, Homilética, Hebraico e Literatura.
Antes, em 1874, ampliando a luta, sentiu de afastar-se do ministério para, além de dedicar-se à educação, concorrer (e acabou sendo eleito) ao parlamento pelo recém-formado Partido Anti-Revolucionário, primeiro partido político moderno da Holanda. No mesmo ano, já eleito, falando ao parlamento, leu Tiago 5.1-11 e defendeu a elaboração de um código que protegesse o trabalhador, numa época em que tais códigos não existiam no mundo. Em 1900, seu partido chegou ao poder e Kuyper se tornou primeiro-ministro, função que exerceu até 1905. Suas principais conquistas foram o reconhecimento, por parte do Estado, do direito dos cristãos conduzirem suas próprias escolas; a ampliação do direito a voto; e a criação da primeira legislação trabalhista de seu país.
De 1905 a 1920 (ano de sua morte), já idoso, o incansável Kuyper decide agora passar a exercer sua influência como redator de um jornal. E conseguiu. Até hoje, suas palavras continuam vivas em seus livros e artigos, e seu exemplo permanece: o de um homem que, em sua geração, não se acomodou diante da onda liberal, mas lutou por uma Igreja viva e pela defesa e proclamação dos valores do Reino de Deus em meio a uma sociedade corrompida. Pensemos nisso.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Deixe "Neustã" ser apenas "Neustã" e Deus será sempre Deus na sua vida

Em Números 21, encontramos a história de "Neustã", a serpente de bronze que foi construída sob a orientação divina. Ela foi colocada no alto de um poste para ser observada pelos israelitas, que foram acometidos por uma praga permitida por Deus como juízo pelos seus pecados. O povo de Israel havia desobedecido a Jeová, ofendido o Seu amor e desrespeitado seu líder Moisés. O caos poderia se estabelecer se Deus não agisse. Por isso, Ele logo interviu e, pela sua misericórdia, depois do arrependimento do povo, fez com que os israelitas que olhassem para a serpente de bronze recebessem a cura.
Considerando o fato de que Deus proibiu a adoração às imagens (Êx 20.4), por que Ele fez com que Seu povo olhasse para a serpente de bronze para ser curado? Esse ato não se constituiria uma aprovação à idolatria?
De forma alguma. O episódio da serpente de bronze está longe de servir de sustentação para os que tentam justificar o uso de ídolos no culto a Deus, por pelo menos três razões.
Em primeiro lugar, porque a serpente de bronze não era um objeto para culto. Ela só foi ganhar um significado idolátrico tempos depois de Moisés. Além disso, quando ela apareceu como objeto de idolatria, foi destruída. O rei Ezequias a despedaçou e chamou-lhe "neustã", que significa “pedaço de bronze”.
“Ele [Ezequias] fez o que era reto aos olhos do Senhor, conforme tudo o que fizera Davi, seu pai. Tirou os altos, quebrou as colunas, e deitou abaixo a Asera; e despedaçou a serpente de bronze que Moisés fizera (porquanto até aquele dia os filhos de Israel lhe queimavam incenso), e chamou-lhe Neustã”, 2Rs 18.3,4 (Almeida Atualizada). Ou seja, ao chamar-lhe de "pedaço de bronze" diante do povo por ocasião de sua destruição, o rei estava querendo dizer que aquela serpente não era nada mais do que um simples objeto que não deveria nunca ganhar contornos de veneração. (Obs.: Algumas traduções dão a entender que os israelitas adoravam a serpente de bronze chamando-a de "Neustã", mas as melhores traduções, principalmente em outras línguas, entendem que o final do texto diz que Ezequias é que a chamou, por desprezo, de "Neustã". Além da Almeida Atualizada [não confundir com Revista e Atualizada], corroboram isso a King James, a Young's Literal Translation, a American Standard Version, Reina & Valera [espanhol], a Riveduta [italiana], Darby [francesa], a de Lutero [alemã] e dezenas de outras traduções).
Em segundo lugar, o poder vivificante que fluía da serpente de metal foi temporal, servindo só para aquele momento e para prefigurar a morte sacrificial de Cristo, que foi levantado na cruz para dar vida a todos que para Ele olharem com fé. Nada se fala posteriormente sobre a serpente de bronze ter mantido a sua condição de meio para o poder curador.
Em terceiro lugar, sua confecção tinha dois propósitos – um primário, que ficou claro já na época, e outro que só foi clarificado posteriormente por Cristo.
O objetivo primário da serpente de bronze era ensinar aos israelitas a submissão. Lembre-se que os israelitas haviam saído do Egito, porém se mostravam rebeldes a Deus e a Moisés. A Bíblia registra que, quando estava a rodear Edom, o povo de Israel começou a se impacientar, falando contra Jeová e Seu servo. Por isso, Deus permitiu que serpentes atacassem os israelitas, o que levou muitos à morte. Como os rebeldes logo depois reconheceram seu pecado e voltaram-se para o Senhor, Ele resolveu livrá-los do mal. Foi aí que Deus orientou Moisés a fazer uma reprodução de metal das serpentes e colocá-la sobre uma haste. À medida que as pessoas eram picadas, olhavam para a serpente sobre a haste e eram imediatamente saradas (Nm 21.4-9). Israel precisava aprender a obediência a Deus. O mesmo Senhor que protegia sua vida poderia punir conforme o erro.
O segundo objetivo foi trazido ao lume séculos depois por Jesus: “E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”, Jo 3.14-15.
Tratava-se, portanto, de uma manifestação da misericórdia divina no Antigo Testamento que apontava para a obra salvadora de Cristo. Aquela serpente de bronze tipifica Cristo, que se fez homem (bronze na tipologia bíblica representa a humanidade) e foi feito pecado por nós (o pecado é representado pela serpente) para nos salvar. Jesus fez-se pecado para que pudéssemos hoje ser livres. Aquela serpente de bronze nos diz que quem deseja ser liberto do pecado e receber a salvação deve voltar-se de coração, na obediência da fé, à Palavra de Deus em Cristo.
Porém, há outra lição que o episódio de "Neustã" nos passa. É a do perigo, muito recorrente em nossos dias, de transformarmos um simples meio – usado por Deus para manifestar a Sua graça – em um objeto de culto. Não era a serpente de bronze que curava, mas Deus. Ele só exigiu que os israelitas olhassem para a serpente de bronze para serem curados porque queria ensinar-lhes, como já falamos, a obediência e, em figura, o que Cristo faria mais à frente. Aquela simples serpente de bronze era apenas um meio e um objeto de valor didático para o povo de Israel e para nós hoje. Porém, os israelitas, tendentes à idolatria, endeusaram aquele pedaço de bronze.
Assim como aconteceu naqueles dias, acontece muito atualmente, quando, por exemplo, algum cristão idolatra um líder, um conferencista ou um cantor, que nada mais são do que simples bronze e um meio, um canal por onde a graça de Deus flui para alcançar vidas.
Quem cura é Deus. Quem salva é Deus. Quem liberta é Deus. Quem transforma é Deus. Quem toca os corações é Deus. Quem convence é Ele. Entretanto, não é raro muita gente atribuir a Neustã, ao “pedaço de bronze”, a glória que só a Deus pertence.
Quis Deus usar excepcionalmente aquele pedaço de bronze há milhares de anos como condição para a cura, assim como prefere nos usar hoje, apesar de nossas falhas, para a concretização de seus planos. Os anjos queriam realizar a nossa missão, diz o apóstolo Pedro (1Pe 1.12), mas Deus preferiu que fôssemos nós mesmos, simples bronze em Suas mãos. Logo, somos apenas canais usados pela generosidade divina.
Portanto, se é Deus, pela sua graça, que nos usa, não aceitemos os incensos que nos são ofertados, as glórias que nos são lançadas, mas remetamos todas elas a Deus, nosso Senhor, o verdadeiro curador, libertador e abençoador.
Quando transformamos um canal em objeto de culto, estamos transformando o simples bronze em um deus. "Neustã" não é Deus. "Neustã" é só "Neustã", um mero pedaço de bronze, que Deus quis usar para trazer, para transmitir algo a alguém.
Como o rei Ezequias, chamemos "Neustã" apenas de "Neustã".
E se "Neustã" está sendo chamado de “deus” em seu coração, coloque fim hoje a esse culto abominável em sua vida, em nome de Jesus.
E você que prega, ensina, canta ou dirige, detendo alguma parcela de liderança e exemplo na obra de Deus, não permita que sejas visto como algo mais do que és: um simples pedaço de bronze nas mãos de Deus.
“E se 'Neustã' já estiver a receber incensos incessantes?” Talvez seja hora de ele ser desfeito, como fez o rei Ezequias com aquela serpente de metal (2Rs 18.4). Talvez seja hora de ser despedaçado e dissolvido pelo fogo de Deus para ganhar uma nova forma, que não lembre mais a antiga, para que não mais entristeçamos o coração de Deus, mas continuemos a ser usados graciosamente por Ele. Isso se queremos, como o rei Ezequias, fazer o que é reto aos olhos do Senhor (2Rs 18.3).
Deixe "Neustã" ser apenas "Neustã" e Deus continuará a ser Deus na sua vida!

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Richard Dawkins, maior ícone darwinista, xinga Deus e a fé em seu novo livro, que será lançado no final deste mês – veja resposta a suas teses

O biólogo inglês Richard Dawkins, eleito recentemente pela publicação britânica Prospect Magazine um dos três intelectuais mais importantes do mundo (junto com Umberto Eco e Noam Chomsky, dois liberais, o que mostra muito claramente a mentalidade prevalecente em nossa época), continua sua onda de ataques à religião como se fosse esta o maior mal do mundo. Dawkins, que também é considerado o maior representante do darwinismo no planeta, terá seu livro The God Delusion (lançado em setembro de 2006 nos Estados Unidos) publicado em português no final deste mês (28 de agosto) pela Companhia das Letras, com o título Deus, um delírio. Trata-se de 528 páginas de puro ressentimento com o avanço da Teoria do Design Inteligente, que está aos poucos conquistando seu espaço no mundo científico.
Sem nenhuma novidade argumentativa, Dawkins sustenta no livro suas velhas e fraquíssimas teses, como a de que a religião (especialmente o judaísmo, o cristianismo e o islamismo) é o maior câncer da sociedade em todos os tempos "porque alimenta a guerra e fomenta o fanatismo". A única novidade desse livro mesmo é a subida de tom no discurso de Dawkins, que passa agora a xingar Deus e a fé absurdamente. Leia as seguintes palavras dele em seu novo delírio literário: “Não estou atacando nenhuma versão específica de Deus. Estou atacando todos os deuses, toda e qualquer coisa que seja sobrenatural, que já foi e que ainda será inventada”. Esse discurso não é familiar? É exatamente a definição bíblica do “espírito do Anticristo”, que já opera em nossos dias: “Ninguém de maneira alguma vos engane; porque não será assim [a Segunda Vinda de Jesus] sem que antes venha a apostasia, e se manifeste o homem do pecado, o filho da perdição, o qual se opõe e se levanta contra tudo o que se chama Deus ou se adora” (2Ts 2.3,4).
A obra de Dawkins é uma síntese do que há de pior no fundamentalismo liberal de nossos dias. Veja você mesmo como ele se refere a Deus em sua nova obra: “Deus, no sentido da definição, é um delírio; e um delírio pernicioso. (...) O Deus da Bíblia é um dos personagens mais desagradáveis da ficção (...) Ele [o Deus da Bíblia] é ciumento, controlador mesquinho, injusto e intransigente, genocida étnico e vingativo, sedento de sangue, perseguidor misógino, homofóbico, racista, infanticida, pestilento, megalomaníaco, sadomasoquista, malévolo”.
Como se não bastasse, Dawkins ainda chama de “abuso” o direito de os pais educarem seus filhos segundo a Palavra de Deus. Ele compara literalmente a educação religiosa de crianças ao abuso infantil!
Outros adeptos das truanices de Dawkins acabam de lançar livros também. Veja só os títulos: Tratado de Ateologia, de Michel Onfray e Deus não é grande, de Christopher Hitchens. Os dois livros, que serão lançados este ano ainda no Brasil, dizem que o maior “obstáculo” e “ameaça” ao desenvolvimento pacífico da Humanidade é a religião, qualquer tipo de religião.
Como vemos, o Ocidente continua em plena guerra ideológica: fundamentalismo liberal versus valores morais e fé cristã. Só que o arcabouço argumentativo dos liberais é muito fraco. Vejamos, como exemplo, os argumentos de Dawkins, como são facilmente anuláveis.
1) “A religião faz mal à humanidade” – Depende em que sentido está se referindo à religião. Se é no sentido de fé cristã bíblica (e com certeza é também, como Dawkins deixa claro), então essa “religião” só faz bem.
Ora, qualquer atrocidade que é feita em nome da Bíblia, de Jesus, do Evangelho, não tem nada a ver com a Bíblia, Jesus ou o Evangelho. Não basta alguém dizer que é cristão e ama a Bíblia para ser considerado cristão verdadeiro. À luz da Bíblia, ser cristão é mais do que isso. Jesus disse que se o amamos realmente, devemos cumprir seus mandamentos (Jo 14.15). Se alguém diz que é cristão e, em nome de sua pretensa fé cristã, faz algo contrário à fé cristã, não pode ser considerado um verdadeiro cristão.
O verdadeiro cristianismo só fez e só faz bem à humanidade. Apenas para citar alguns exemplos bem conhecidos no meio secular: William Wilberforce e a luta pela abolição da escravatura; as milhares de obras sociais pelo mundo, que restauram vidas e famílias; o Avivamento Metodista no século 18, que evitou que a Inglaterra experimentasse uma terrível guerra civil como a França no mesmo período; a fundação de universidades; a alfabetização da Europa; a liberdade de expressão etc, etc, etc. Fora a transformação que o verdadeiro Evangelho provoca na vida das pessoas.
Enfim, outro erro crasso dentro desse pensamento é o da generalização. Ainda que existam cristãos falsos, isso não significa que todo cristão é falso e que, portanto, o Evangelho não é bom. Por essas e outras, é estranho ver Dawkins como uma das “melhores cabeças” de nosso tempo. Seu raciocínio nos leva a crer que ele é, sim, uma das piores.
2) “Ensinar religião às crianças é abuso” – Desde quando ensinar valores morais, cristãos, saudáveis, é abuso? O problema é que o mal, para Dawkins, é tudo que não é como ele acha que deve ser. Deus não é um delírio. Dawkins é que está delirando há muito tempo. Para entender melhor a loucura de suas idéias, sugiro lerem o meu artigo “A terrível intolerância do fundamentalismo liberal”, postado no dia 3 de agosto.
3) “Deus é...” – O maior pecado de todos, a mãe de todos os pecados, é o orgulho, a arrogância. Ora, as definições que Dawkins faz de Deus revelam muito sobre quem Dawkins é: um arrogante.
Para ele, Deus é “ciumento”, no sentido negativo. Ora, uma rápida análise no que a Bíblia chama em alguns momentos de “ciúmes de Deus” já é o suficiente para perceber que esse “ciúme” não tem, obviamente, nada a ver com os ciúmes humanos, pois Deus respeita a liberdade de escolha de suas criaturas. Se Ele não respeitasse, não teria nem criado seres com livre-arbítrio, mas robôs. Um ciúme, do tipo humano, o levaria a criar robôs, não seres livres. Só porque Deus não deseja que suas criaturas se percam e porque ama-as ao ponto de fazer de tudo para que não se percam, mas sempre respeitando o livre-arbítrio de suas criaturas, Ele é ciumento no sentido negativo? Não! Esse “ciúme” de Deus é amor! Verdadeiro amor! É a arrogância de Dawkins que o faz ver o contrário, torcer o significado claro do texto bíblico.
Deus é “controlador mes-quinho” só porque não permite o pecado e governa o universo sob valores morais claros? Se Deus não se importasse com o pecado, Ele seria o que, então? Digamos que o mundo fosse como Dawkins queria que fosse, sem um resquício dos valores morais e bíblicos. O que teríamos? (Se quiser, leia a postagem “Entenda o processo de desconstrução da fé” do dia 8 de agosto para ver o que teríamos e entender melhor o absurdo desse pensamento).
Deus é “injusto, intransigente e vingativo” só porque julga a iniqüidade? Ele é “genocida étnico”, só porque no Antigo Testamento se levantou contra nações ímpias que queriam destruir Seu povo Israel? Deus é “sedento de sangue” só porque no Antigo Testamento exigia o sacrifício de animais pela expiação da culpa, para cobrir o pecado de seus filhos, e chegou ao ponto de sacrificar Seu próprio Filho, como registrado no Novo Testamento, como sacrifício definitivo e suficiente para salvação de todos aqueles que quiserem ser salvos? Isso não seria amor e justiça verdadeiros?
Deus seria “perseguidor misógino” só porque estabeleceu os lugares específicos da mulher e do homem, em vez de querer que a mulher seja como o homem em tudo e vice-versa? Deus não é feminista nem machista. Deus é o Senhor de toda a criação, e em Cristo “não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gl 3.28). Deus é “homofóbico” só porque é contra o homossexualismo?
Deus é “racista” se a Bíblia diz que Deus não faz acepção de pessoas e deseja que todos, de todas as etnias, sejam salvos (At 10.34,35; 1Tm 2.3,4)? Deus é “infanticida impiedoso”, se as crianças que foram mortas na destruição de cidades ímpias, que queriam destruir os israelitas do Antigo Testamento, foram, à luz da Bíblia, para o Céu?
Como morreram com uma idade em que ainda não eram conscientes e responsáveis por seus próprios atos moralmente, essas crianças não se perderam. Ao contrário, estão melhores do que nós hoje, pois estão no Céu. As seguintes passagens bíblicas dão suporte claro para a salvação das crianças que morrem na primeira infância: 2Samuel 12.23, que fala do bebê, filho de Davi com Bateseba, indo direto para o Céu; Isaías 7.16, que afirma que existe uma idade em que a criança se torna responsável; Salmos 139.14-16, que fala de crianças escritas no livro de Deus no Céu; e Marcos 10.14, dentre algumas outras passagens.
Logo, ao morreram na destruição daqueles cidades ímpias que queriam destruir Israel, as crianças estavam sendo alvo de um ato misericordioso de Deus, que tirou-as de um ambiente extremamente pervertido para trazê-las à sua santa presença.
Deus é “pestilento” só porque julgava a iniqüidade muitas vezes com pragas? Deus é “megalomaníaco” se Ele é DEUS? Deus é “sadomasoquista” porque se permitiu sofrer pela humanidade na pessoa bendita de Jesus (Deus encarnado)? Enfim, depois de tudo isso, Deus é “malévolo”?
Não, Dawkins. Você é que é. E muito.

domingo, 12 de agosto de 2007

Assista a comunicado sobre cisão na Assembléia de Deus Betesda por causa do Teísmo Aberto

O vídeo acima foi veiculado em canais de tevê do Nordeste nas últimas horas. Enfatizamos mais uma vez neste blog que o fato entristece-nos e, como irmãos em Cristo, devemos orar. Porém, não podemos também deixar de alertar quanto aos males que o Teísmo Aberto começa a causar no Brasil. Mesmo que outros interesses (além da preocupação doutrinária) existam por trás dessa cisão, fato é que ela só se deflagrou, só se tornou possível, porque ensinos equivocados, contrários à Palavra de Deus, começaram a ser claramente ensinados. Não podemos perder isso de vista, pois foi aí que tudo começou.
Mais sobre o assunto, inclusive uma análise sobre o que realmente é o Teísmo Aberto, os perigos de seus pressupostos para a ortodoxia bíblica e a gênese da expansão desse ensinamento no Brasil, você pode encontrar no texto abaixo, postado em 10 de agosto.

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

O canto de sereia do Teísmo Aberto já começa a provocar divisões no meio evangélico

É com tristeza que recebemos a notícia de que o Teísmo Aberto já está provocando terríveis resultados em nosso país, algo que temíamos que acontecesse. Uma importante denominação evangélica no Brasil, sobretudo no Nordeste e em São Paulo, está "rachando" justamente por causa disso. Trata-se da Igreja Betesda. Membros da referida igreja no Nordeste (que ainda preservam o antigo nome de fundação - Igreja Evangélica Assembléia de Deus Betesda, fundada em 1981 pelo jovem pastor Ademir Siqueira Gonçalves), preocupados com os ensinos do Teísmo Aberto em sua denominação, resolveram “desvincular-se doutrinariamente” da Igreja Betesda de São Paulo, liderada pelo pastor Ricardo Gondim Rodrigues. A decisão foi divulgada primeiramente em uma nota no jornal Diário do Nordeste de 7 de agosto. Porém, desde o início da semana, o site do pastor Ricardo Gondim já estava "de luto" por causa do ocorrido.
Para quem não se lembra, tudo começou no início de 2005. Devido à comoção mundial provocada pela tsunami arrasadora do Natal de 2004, alguns pensadores evangélicos no Brasil (sobretudo os pastores Ricardo Gondim e Ed René Kivitz, da igreja Batista de Água Branca - SP) passaram a propagar a necessidade de uma nova compreensão de Deus chamada Teísmo Aberto ou Teologia Relacional para tentar explicar a seguinte dúvida que, via de regra, surge sempre após alguma catástrofe natural de grande porte: “Se Deus é bom e todo-poderoso, como pode Ele permitir catástrofes desse tipo?”
Na verdade, a tsunami foi apenas a catalisadora do movimento, já que o Teísmo Aberto (passarei a chamar de TA daqui para frente) já começava silenciosamente a ganhar adeptos em alguns pequenos círculos de reflexão teológica em nosso país, devido à descoberta (e em alguns casos, à redescoberta) da obra de teólogos estrangeiros defensores dessa nova visão de Deus. Refiro-me aos escritos de Jürgen Moltmann e Wolfhart Pannenburg (teólogos já octogenários) e a obras mais recentes, como as de Clarck Pinnock, Greg Boyd e John Sanders.
Ainda em 2005, devido à expansão do TA, à importância do assunto, à ausência de reflexão teológica sobre o tema no meio pentecostal (entre outros ramos protestantes já havia) e à constatação de que alguns crentes desavisados já estavam flertando com as idéias do TA, senti a necessidade de entrar na linha de frente contra essa nova interpretação do Deus da Bíblia. Naquele mesmo ano, escrevi artigos na revista Manual do Obreiro (julho/2005) e no jornal Mensageiro da Paz (setembro/2005), órgão oficial da Assembléia de Deus no Brasil, combatendo os pressupostos do TA. Em dezembro de 2006, lancei meu quinto livro – Como vencer a frustração espiritual –, onde inseri um capítulo inteiro falando sobre os perigos de aderir à falácia do TA. Enquanto isso, o assunto continuava a ser debatido em blogs e artigos em outras revistas evangélicas. Aos poucos, o TA deixou de ser visto como uma “diferença teológica de somenos importância” para ser entendido como doutrina perigosa para quem deseja uma espiritualidade sadia.
Como repercussão do debate, que naquela época já envolvia vários setores do meio evangélico (os batistas, por exemplo, já começavam a refletir seriamente sobre o assunto), em 16 de janeiro de 2007, o Portal Elnet publicou uma matéria alertando sobre os perigos do TA. Na ocasião, tive o privilégio de, juntamente com o pastor presbiteriano Augustus Nicodemos, ser entrevistado para apontar os equívocos desse pensamento. Depois de publicada a matéria, os colegas jornalistas do portal contaram-me que quiseram até entrevistar os defensores do TA, a fim de que defendessem suas teses frente aos nossos argumentos, mas, estranhamente, os pregadores do TA se negaram a falar algo sobre o assunto. De lá para cá, alguns desses teólogos relacionais passaram até a afirmar, sem muita convicção, que "não era bem assim", que não eram "tão" adeptos do TA, etc. Porém, recentemente, aconteceu uma recaída, o que foi fatal.
Aproveitando que, devido a esse fato, o TA volta à tona nos debates, exponho, a seguir, uma análise sintética sobre o que é realmente o TA e porque seus pressupostos são perigosos.

O que é Teísmo Aberto?

O Teísmo Aberto (Open Theism), também chamado de Abertura de Deus (Openness of God) ou Teologia Relacional, é um falso ensino que nasceu em meio ao debate entre duas correntes teológicas: o arminianismo e o calvinismo. Na ânsia de defender o arminianismo, alguns teólogos, líderes e pensadores evangélicos descambaram para essa teologia equivocada. Trata-se de um arminianismo bizarro, rejeitado tanto por calvinistas quanto por arminianos.
Teísmo Aberto é uma invenção teológica que declara que (1) o maior objetivo de Deus é entrar num relacionamento recíproco com o homem, onde o Criador é afetado pela criatura e aprende com ela; (2) que todas as referências bíblicas a Deus devem ser interpretadas sem qualquer antropomorfismo; (3) que Deus criou um mundo onde Ele pode ser afetado pelas escolhas dos homens; e que (4) Deus não conhece o futuro plenamente, nem as escolhas livres que suas criaturas ainda farão.
Em outras palavras, o TA apresenta um Deus mais humano, mais vulnerável, que não tem tanto controle sobre as coisas. Por isso, é um Deus mais palatável para as pessoas que querem entender o problema do mal no mundo sem culpar a Deus.

Os cinco pilares do Teísmo Aberto

O Teísmo Aberto ensina, basicamente, cinco coisas:
1) O maior atributo de Deus é o amor – No TA, este atributo divino é normalmente enfatizado em detrimento a todos os demais atributos de Deus. Todos os atributos divinos, mesmo sua imutabilidade, sua onisciência e sua onipotência, são diminuídos e reinterpretados para favorecer o atributo do amor. Porém, a Bíblia nos apresenta todos os atributos divinos coexistindo em equilíbrio. Deus não é amor e mais ou menos onisciente e onipotente. Ele é amor e plenamente onisciente e onipotente (Gn 17.1; Jó 42.2; Sl 139 e Is 46.10). A Bíblia não apresenta incoerência na coexistência dos atributos de Deus. Deus é onipotente e justo ao mesmo tempo. O amor de Deus não é incompatível com a Sua onipotência.
O que é onipotência? É a qualidade de ter todo o poder. O vocábulo oni significa “tudo” ou “todo”. Logo, quando dizemos que Deus é onipotente, não estamos dizendo simplesmente que Ele é poderoso, mas afirmando que só Ele detém todo o poder. Há muitas passagens na Bíblia que realçam esse atributo divino (Gn 18.14; 2Cr 20.6; Jó 42.2; Sl 62.11; 147.5; Is 14.27; 43.13; Dn 4.35; Lc 1.37). Deus se apresentou como o Onipotente a Abraão (Gn 17.1) e a Jó (Jó 40.1-2). Jesus, Deus encarnado, afirmou que “todo o poder” lhe foi dado “no Céu e na Terra” (Mt 28.18). Ele “sustenta todas as coisas pela palavra do seu poder” (Hb 1.3). E mais: “Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1.3).
2) Deus não é tão soberano assim Para os seguidores desse neologismo teológico, só pode haver pleno relacionamento entre Deus e o homem se o Criador construir a História com o auxílio do homem, no sentido de o homem ter o poder de frustrar Deus e mudar as decisões divinas. O futuro só pode ser construído a partir da conjunção entre Deus e as decisões humanas. Segundo eles, Deus se adapta à vontade e às decisões dos homens, e não pode realizar tudo que deseja, só com o auxílio do homem.
“O homem é o sujeito da História. A História não está sob o controle divino totalmente. Conforme as decisões dos homens, Deus vai definindo como será a História. O futuro, como diziam Moltman e Pannemburg, está em aberto, até mesmo para Deus!”, afirmam.
Isso contraria frontalmente o ensino bíblico. Diminui Deus e exalta o homem. O ser humano tem autonomia para tomar suas decisões, mas nenhuma decisão humana pode mudar aquilo que já foi estabelecido por Deus (Is 46.10).
Há a vontade permissiva e a vontade soberana de Deus. O homem pode tomar decisões e mudar contextos até onde isso não contrarie o que já foi determinado pelo Criador. Deus é o Senhor da História, não o homem.
A máxima do TA de que “Deus cedeu lugar ao homem após a Criação do mundo” é um erro grosseiro. Quando lemos Gênesis, encontramos Deus intervindo diretamente na História, como Senhor da História, na salvação de Noé e sua família, no chamamento de Abrão, na vida de Isaque e Jacó, na vida de Jó, na libertação de Israel do Egito etc. De Gênesis a Apocalipse, Deus age na História. Ele não é um ser passivo. Ele é ativo. Deus não saiu de cena após criar o mundo, dizendo: “Seres humanos, agora é com vocês!”

3) Deus não conhece o futuro – O TA acredita que Deus não conhece o futuro. Os adeptos dessa teoria se dividem entre dois argumentos. Uns dizem que Deus não pode conhecer o futuro porque o futuro não existe. Logo, é impossível algum ser ter presciência. Por conseguinte, o futuro está aberto até para Deus (sic). Outros teístas abertos afirmam que mesmo que Deus tenha o poder de saber o futuro, Ele o ignora porque escolheu não saber o que virá (sic). Assim, o futuro, também nessa perspectiva, está em aberto para Deus.
Um elemento muito importante para esse pensamento é a crença de que Deus não está fora do tempo, vendo o passado, o presente e o futuro como se fossem uma só coisa para Ele. Para o TA, Deus está dentro do tempo e sujeito a ele. O tempo, segundo eles, é uma realidade que antecede o Criador ou coexiste com Ele. Porém, a Bíblia afirma que Deus é Eterno e transcendente (Is 57.15). Ele não teve começo e não terá fim, e o tempo foi criado por Ele (Sl 90.2). Deus sabe de tudo antes de tudo acontecer. Ele não está preso ao tempo (Sl 102.27).
4) Deus se arrisca – “Deus se arriscou ao criar seres livres e racionais. Ele não sabia que decisões os anjos e os homens tomariam depois de criados, e ainda hoje o Criador se arrisca com suas criaturas, pois ignora as escolhas futuras delas”. Absolutamente equivocado. A Bíblia diz que Cristo é “o Cordeiro de Deus imolado antes da fundação do mundo” (1Pe 1.19-20 e Ap 13.8). Deus já sabia de tudo que iria acontecer e de antemão elaborou o Plano da Salvação. Deus não foi e não é pego de surpresa!
5) Deus comete erros, aprende e muda – Segundo o TA, como Deus desconhece o futuro, Ele aprende com as realidades à medida que elas vão acontecendo. O Deus da Teologia Relacional é vulnerável, comete erros, aprende com eles e muda de posição. De acordo com o TA, Deus muda seus planos constantemente. Por isso, os adeptos desse pensamento ensinam que é errado afirmar que quando a Bíblia fala que Deus “arrependeu-se” está usando um antropomorfismo. Para eles, Deus arrependeu-se mesmo. Ele mudou de idéia. Deus é mutável. Ele é totalmente passível de influências do ser humano.
Porém, a Bíblia diz claramente que Deus não se arrepende e Ele não muda (Nm 23.19-20 e Ml 3.6). O “arrependimento” de Deus é antropomorfismo mesmo. Ou seja, é uma expressão humana usada para tentar explicar ao ser humano Deus e suas manifestações, posto que Deus não é como o ser humano.
Se quiser saber mais sobre o assunto, é só ler o capítulo 9 do meu livro Como vencer a frustração espiritual (se quiser adquiri-lo, entre em http://www.cpad.com.br/ ou acesse o link do livro na coluna de links ao lado das postagens). Também há outros bons livros no mercado falando exclusivamente sobre o assunto.
Em julho deste ano, a revista de apologética cristã Resposta Fiel, da qual sou editor pela graça de Deus, iniciou a publicação de uma série de artigos do teólogo norte-americano Norman Geisler sobre os erros do TA. Os artigos foram publicados originalmente nos Estados Unidos como tréplica à réplica do teólogo John Sanders (defensor do TA nos EUA) às críticas de Geisler ao TA. A segunda parte da série de artigos sairá na edição do terceiro trimestre de Resposta Fiel, que sai em outubro. Se quiser adquirir a revista, entre no site http://www.cpad.com.br/

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Entenda o processo de desconstrução da fé

Todo mal tem um início. Não é diferente com as idéias que permeiam atualmente a sociedade ocidental. Que o diga o crítico social Russell Kirk.
Russell Amos Kirk (1918-1994) foi um notório jornalista cultural e cientista político norte-americano, conhecido pelo seu conser-vadorismo. Ele escreveu mais de 30 livros, tanto de ficção como de não-ficção, além de centenas de ensaios e resenhas. Foi colunista em vários periódicos nos Estados Unidos, fundador da revista de cultura Modern Age e editor por 30 anos da revista The University Bookman, de resenhas de livros. Mas, sua maior obra só veio a lume em 1953, quando Kirk lançou um livro que se tornou clássico rapidamente nos EUA, sendo considerado hoje a melhor obra para entender tanto a formação e o desenvolvimento do conservadorismo na tradição anglo-americana como as raízes e o desenvolvimento do pensamento liberal no Ocidente. Estou falando de The Conservative Mind: from Burke to Eliot (O Conservadorismo: de Burke a Eliot).
Nesse livro, o crítico americano afirma que a onda liberal que hoje vemos no mundo (com a pregação a favor do aborto, da liberação das drogas e da promiscuidade sexual) nasceu no período histórico denominado “Idade da Razão”, especialmente no século 18. Kirk diz ainda que um dos primeiros a denunciar eloqüentemente os efeitos nefastos do liberalismo em sua gênese foi Edmund Burke (1729-1797), pensador e político britânico.
Segundo Kirk, antevendo o futuro, Burke criticou em sua época três escolas que chamou de “radicais” e que estavam tornando-se bastante populares em seus dias: (a) o racionalismo dos filósofos; (b) o nascente utilitarismo do filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham; e (c) o sentimentalismo romântico do filósofo francês Rousseau. Esse último Burke chegou a chamar de “o Sócrates louco”. O detalhe é que, em sua análise, o político britânico identificou alguns pontos que caracterizaram a onda liberal daquela época, dando-lhe base. Entre eles estão:
1) A crença de que, se Deus existe, “difere radicalmente em sua natureza da idéia do Deus cristão; ele seria ou o ser remoto e impassível dos deístas ou o brumoso e recém-criado Deus de Rousseau”;
2) A idéia de que o homem, diferentemente do que a Bíblia diz, não é tendente ao pecado, mas é naturalmente bom, generoso e benevolente, sendo corrompido pelas instituições;
3) A convicção de que as tradições da humanidade e o ensino bíblico são mitos, confusos e ilusórios, e nos ensinam muito pouco;
4) A fé no ser humano, como sendo capaz de aprimorar-se sozinho e trazer a paz e a ordem ao mundo sem precisar de alguma ajuda divina;
5) O pensamento de que devemos buscar a “libertação das velhas crenças, dos tabus, dos juramentos e das velhas instituições”, e regozijarmo-nos com “a pura liberdade e a auto-satisfação”.
Como vemos, foi ali, no século 18, que a atual onda liberal teve seu início. Foi Jean Jacques Rousseau quem “decretou” a morte do pecado, ao pregar a teoria da plena bondade natural do ser humano. Depois dele, veio Augusto Comte, com o seu positivismo, afirmando que a religião é o estado primitivo da sociedade. O iluminismo proclamou que a religião não era mais relevante. Assim, chegamos ao ponto onde estamos hoje.

A sociedade está moralmente à deriva

Esses cinco pontos esposados por Edmund Burke e que apresentamos acima explicam, por exemplo, o porquê de a sociedade de hoje viver em um nível moral muito baixo. Já dizia Russell Kirk, em sua obra supracitada, que “problemas políticos e sociais são, no fundo, problemas religiosos e morais”. E ele não está errado. As questões sociais são, lá no fundo, uma questão de moral pessoal. Não é necessário um grande exercício mental para perceber isso.
Imagine uma sociedade onde as pessoas são governadas pela crença em uma ordem moral duradoura, por um forte sentido de certo e errado, por convicções pessoais sobre a justiça e a honra. Com certeza será uma sociedade sadia, que fugirá tanto do extremo da tirania quanto do extremo da anarquia.
Agora, imagine uma outra sociedade, onde as pessoas vivem moralmente sem rumo, ignorando o certo e o errado. Seria uma sociedade onde cada um estaria voltado para sua gratificação pessoal, atrás da satisfação de seus próprios apetites. Sem dúvida, seria uma sociedade doentia, tanto na sua versão mais radical (o anarquismo) quanto na sua versão liberal mais leve, que está sendo implementanda hoje em nossa sociedade.
Não é à toa que é bastante comum vermos os pensadores pós-modernos identificando a sociedade em que vivemos como inundada de patologias, crises e profundos vazios existenciais. À medida que o tempo passa, os valores morais vão perdendo seu significado e força, o que resulta em uma sociedade cada vez mais neurótica, hedonista, egoísta e violenta.
Um sintoma da crise em que vive o mundo é a atual produção artística no planeta. Sabemos que a produção artística de uma época diz muito sobre os problemas, angústias, medos, conquistas, sonhos e aspirações de uma geração. Ora, os livros de ficção, filmes, peças teatrais e pinturas de hoje estão repletos de personagens psicóticos ou figuras que não trazem substancialmente nada, só o vazio. Isso é porque a alma humana no século 21 encontra-se assim.
Outro dia um articulista carioca escreveu, em sua coluna em um dos jornais mais influentes do país, sobre sua profunda infelicidade existencial, chegando a afirmar que tinha inveja da lagartixa, que não aspira nada, a não ser a satisfação de seus instintos naturais. E não foram poucos os que se identificaram com ele!
Os perigos de uma sociedade assim é que, por não ter firmeza moral e sentido na existência, está aberta a qualquer bizarria. Está moralmente à deriva. O único conceito que consegue-se assimilar é o que diz: “Não se pode reprimir direitos”. Mas onde estão os deveres? Apesar de ainda existirem alguns deveres reconhecidos, até mesmo estes, vez por outra, são questionados por celebrizadas “mentes privilegiadas” de nossos dias. Isso porque, via de regra, o que prevalece no inconsciente coletivo da sociedade de hoje é a idéia de que o dever é visto como mal, “castrador”, destruidor, camisa-de-força. Por isso, os projetos de lei de hoje, em sua maioria, não buscam impor limites; pelo contrário, os retiram.
O cristão genuíno, porém, não sofre essas crises, pois uma vez que reconhece a Palavra de Deus como sua única regra de fé e prática, ele não relativiza, inverte ou esvazia valores. Ele se apóia e orienta-se em valores concretos, claros e absolutos das Sagradas Escrituras. Seu comportamento e pensamentos são pautados por ela, o que, em vez de inibir sua vocação e suas habilidades, as desenvolvem. Ele percebe limites e, por isso, compreende a existência como um todo e, em particular, a sua missão na vida. Isso porque sem limites é impossível andar com segurança ou mesmo entender a existência. Limites são uma necessidade da própria existência. Eles foram criados por Deus para o melhor aproveitamento da vida. Desrespeitá-los é ser infeliz ou infelicitar o próximo.
A sociedade de hoje precisa de valores. Isso significa limites, mas também sentido, caminho. Em outras palavras, o mundo necessita mais do que o retorno aos valores ou princípios judaico-cristãos. Precisa da Palavra de Deus. O mundo precisa de Cristo.
Identificamo-nos com a luta de todo grupo conservador em favor da preservação dos valores que têm seu apoio nas Sagradas Escrituras, porém nossa luta é muito maior. Não é só mourejar pela manutenção dos imprescindíveis valores sociais herdados pela formação judaico-cristã da sociedade ocidental. São também, e precipuamente, a pregação e a defesa dos princípios da Palavra de Deus, da Verdade do Evangelho. Essa é a nossa missão.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

NOVO ALERTA NO CONGRESSO NACIONAL!

Meus queridos irmãos e amigos, recebi hoje à tarde um e-mail do pastor Ademir Kreutzfeld (para quem não sabe, o pastor da Igreja Evangélica Luterana que está sendo perseguido pelo Movimento Gay em Santa Catarina por pregar que homossexualismo é pecado à luz da Bíblia). Enquanto estamos com a atenção voltada para o PLC 122/2006, que institui o crime de homofobia no Brasil e fere as liberdades de fé e expressão no país, os militantes da causa homossexual conseguiram "passar a perna" nos evangélicos e católicos no Congresso Nacional. Um outro projeto, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), o PL 6418/2005, que já fora aprovado no Senado, foi alterado na Câmara Federal, incluindo em seu texto o crime de "preconceito por orientação sexual", e será votado amanhã na Câmara dos Deputados. AMANHÃ! Se aprovado, vai direto para sanção presidencial. Eles viram que há pouquíssimas chances de aprovação do PLC 122/2006 e, sorrateiramente e às pressas, alteraram o texto de outro projeto que tramitava sem alarde, incluindo nele o mesmo teor do PLC 122/2006.
Mais sobre o assunto, é só acessar o http://www.juliosevero.com.br/, que já dá detalhes sobre o caso.
Para enviar e-mails de hoje para amanhã para todos os deputados federais, o endereço é http://www2.camara.gov.br/internet/popular/falecomdeputado.html/

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

A terrível intolerância do fundamentalismo liberal

Uma onda de intolerância ao cristianismo, camuflada por um falso discurso de liberdade e imparcialidade, tem avançado no Ocidente.
Ela já reina soberana na Europa, amordaçando a fé da maioria das igrejas. Alguns cristãos nos Estados Unidos ainda lutam valentemente contra ela, recusando-se a ter sua fé amordaçada. No Brasil, porém, os tentáculos desse movimento já começam a se instalar e muitos cristãos ainda não despertaram para isso.
A ordem em que cito as nações no parágrafo acima (Europa-EUA-Brasil) não é por acaso. Muitos modismos filosóficos e projetos de lei liberais nascem na Europa, fazem escala nos Estados Unidos e, só depois, desembarcam no Brasil. Essa rota nos indica que se queremos ter uma idéia de como poderá ser o nosso futuro, é só olharmos para o ponto de partida desses modismos: a Europa. Ela é a grande fonte inspiradora da maior parte dos intelectuais de hoje que defendem mudanças na sociedade.

Influência liberal européia na cultura ocidental

É crescente e preocupante a influência liberal européia na cultura ocidental. Mas, não me interpretem mal. Não sou anti-europeu.
Quero ressaltar que a Europa é um continente lindo e um exemplo positivo em várias áreas (na qualidade dos serviços públicos, por exemplo). Além do mais, é berço de muitos movimentos importantes, inclusive de ordem espiritual. Foi no continente europeu que nasceu a Reforma Protestante. Aquela região também foi palco de muitos reavivamentos extraordinários, como o Avivamento Wesleyano do século 18 e o início das Missões Modernas, no século 19. Porém, hoje, é fato que as igrejas européias estão arrefecidas espiritualmente, frias, vazias e amordaçadas, isto é, sem exercer mais influência na cultura do continente.
Por outro lado, a Europa passou a exercer nos últimos anos uma influência mundial extremamente negativa no campo filosófico, atacando especialmente os princípios judaico-cristãos.
Em artigo publicado no jornal New York Sun, edição de 11 de maio de 2004, o colunista Daniel Pipes afirma: “A Europa está se tornando, cada vez mais, uma sociedade pós-cristã, rompendo os laços com sua tradição e seus valores históricos. O número de cristãos praticantes despencou tanto nas duas últimas gerações, que alguns observadores já estão chamando a Europa de ‘novo continente das trevas’. Analistas estimam que, semanalmente, as mesquitas britânicas recebem mais fiéis que a Igreja Anglicana”.
O escritor Peter Hitchens, nas páginas 34 e 35 de seu livro The Abolition of Britain: From Winston Churchill to Princess Diana (Encounter Books, 2000), declara, citando o caso particular da Inglaterra:
“O inferno foi abolido mais ou menos no mesmo tempo em que se legalizou o aborto e a pena de morte foi eliminada. Afinal de contas, ninguém mais ia para o inferno, não é mesmo? Pois, lá pela década de 60, a condenação eterna, assim como a maior parte dos aspectos preocupantes da religião cristã, havia, aparentemente, caído em desuso. Os bispos tinham começado a admitir, de início muito timidamente, que não tinham certeza da existência de Deus nem da veracidade das doutrinas centrais de sua religião”.
“Quando não há almas a serem salvas, mas apenas corpos, só resta um objetivo: melhorar suas condições de vida, mesmo que eles depois acabem mergulhados na mais severa miséria moral. Quando não acreditamos no pecado, não é de se esperar que nos esforcemos muito em lutar contra ele. E, se acreditamos nele, dizem que estamos ‘julgando os outros’ e somos automaticamente excluídos do debate”.
Elwood McQuaid, editor-chefe da revista The Friends of Israel, pertencente ao ministério para-eclesiástico evangélico de mesmo nome (www.foi.org), comenta as palavras de Hitchens:
“Talvez a parte mais reveladora da análise de Hitchens seja esta: ‘E, se acreditamos nele [no pecado], dizem que estamos ‘julgando os outros’ e somos automaticamente excluídos do debate’. Esse é o ponto crucial do problema (...) Não estamos falando aqui de uma questão de semântica ou de diferenças de opinião teológica superficiais. As pessoas que acreditam firmemente nos princípios fundamentais da fé cristã são vistas com hostilidade, como insuportáveis adversários ‘julgadores’ que impedem a chegada da nova era liberal de ‘iluminação’”.
McQuaid denuncia em seu livro A Tirania da Minoria – atacando os valores judaico-cristãos (Editora Chamada da Meia-Noite) que muitos cristãos sofrem perseguições ou restrições em países europeus, e que essa onda de intolerância, que já alcançou os Estados Unidos, se manifesta com intensidade crescente em todo o mundo ocidental.
Talvez isso seja um indício da perspectiva escatológica de que a União Européia será o último grande império mundial antes do Milênio (Dn 2.41-44), como defendido pela maioria dos teólogos conservadores. Esse império, frisam, exercerá forte influência no resto do mundo e se oporá à fé cristã. Porém, seja indício disso ou não, está mais do que claro que enquanto os pensadores liberais europeus forem vistos como exemplos de “idéias avançadas” nos Estados Unidos, Brasil e outros países, essa onda de intolerância ao cristianismo estará em alta.
Enquanto políticas liberais como as da Holanda, por exemplo, aparecerem em novelas, artigos e discursos como exemplos de “avanços” a serem seguidos, devemos ficar preocupados (o governo holandês aprovou a legalização do “casamento” homossexual e das drogas, a descriminilização do aborto, a profissionalização da prostituição e discute a liberalização da pedofilia em casos de meninos e meninas com idade a partir de 13 e 12 anos).
Enquanto os políticos, líderes, educadores e a maioria da mídia pensarem que o que há de mais atrasado no Ocidente são os ideais conservadores judaico-cristãos e o que há de mais interessante são os ideais liberais, ateístas e naturalistas europeus, o perigo da mordaça estará de pé.
Enquanto todos os que pensam diferentemente dessa onda forem taxados de “inimigos dos avanços”, “retrógrados”, etc, precisamos ficar em alerta. O fundamentalismo liberal quer neutralizar a influência dos princípios morais e cristãos na sociedade, e, como sal e luz do mundo (Mt 5.13-16), como Igreja aqui na Terra, não podemos ficar passivos.

O exemplo norte-americano

Veja o exemplo dos Estados Unidos. Qual a massa de norte-americanos mais xingada e execrada pela mídia de lá, de cá e da maior parte do mundo? Aquela formada pelos defensores dos princípios judaico-cristãos. A mídia e os cientistas sociais chamam esse grupo costumeiramente de “obscurantistas”, “primitivos”, “retrocesso”, “a massa mais atrasada dos Estados Unidos”, “trevas” e “atraso”. Todos esses termos já apareceram ipsis literis na imprensa brasileira e norte-americana em referência aos cristãos daquele país. Dei-me o trabalho de marcá-las em vários jornais e revistas. E é interessante notar como os evangélicos no Brasil são chamados por esses mesmos críticos de “massa ignara”, “vermes” (recentemente, em um jornal do Rio de Janeiro) e “retrocesso”, entre outros termos.
Enquanto isso, os liberais dos Estados Unidos, os esquerdistas (tanto políticos quanto artistas, cientistas e jornalistas), “europeizados” em sua concepção de valores e moral, são incensados, louvados, vistos como “a banda boa dos EUA”, “o que há de melhor naquele país” (como já definiu um liberal articulista brasileiro).
É sintomático o fato de que, de vez em quando, esses idealistas norte-americanos (como alguns articulistas do liberal The New York Times) afirmam explicitamente que o seu país “deveria seguir o exemplo dos europeus, que são mais avançados”. E via de regra, isso é dito em questões que envolvem valores morais e religiosos.
Para entendermos melhor o que está acontecendo nos Estados Unidos, basta ler obras como Verdade Absoluta, de Nancy Pearcey, e E agora, como viveremos?, de Charles Colson e Pearcey (para citar as mais populares). E é bom olharmos de vez em quando para o que está acontecendo na América do Norte, porque, como já afirmamos, as idéias geralmente fazem escalas lá antes de desembarcarem aqui e em outros países. Por serem os Estados Unidos a maior potência, é a partir de lá que essas idéias são disseminadas, espalhando-se para o resto do mundo. Tudo o que acontece nos Estados Unidos ganha destaque na imprensa de todo o planeta. Mas, na maioria das vezes e infelizmente, só o que vem da falsa “banda boa” norte-americana.
Alguém pode dizer: “Será que muitos desses xingamentos e críticas não são apenas reação ao mau testemunho de muitos cristãos?” Gostaria de dizer um altissonante “sim”, mas, infelizmente, não é isso que acontece.
Uma rápida olhada no contexto em que são proferidas as ofensas dos liberais aos cristãos mostra que na maioria das vezes elas não são referência a uma generalização do que seja o perfil evangélico a partir do mau testemunho de alguns crentes. São, pelo contrário, uma alusão direta aos princípios defendidos pelos cristãos de forma geral. É intolerância ao pensamento cristão, como se fosse o mais pernicioso do mundo. E quando há algum mal testemunho, este é apenas aproveitado como pretexto para revisitar as críticas aos cristianismo. Além disso, apesar de haver muitos cristãos dos EUA e do Brasil que dêem mau testemunho (E como há!), nada justifica uma generalização.

Ironia das ironias: quem prega “tolerância” é o mais intolerante

A grande ironia do uso do termo fundamentalismo em nossos dias é que justamente aqueles que o usam com o sentido de intolerância (os liberais) são os mais intolerantes de todos.
Uma análise da cultura ocidental hodierna comprova que não há nada mais contraditório hoje no mundo do que o fundamentalismo liberal, porque não há nada mais intolerante hoje no Ocidente do que o liberalismo. É pura intolerância camuflada de tolerância para enganar ingênuos.
Para entender melhor o que estamos falando, urge explicar no que consiste o liberalismo de que falamos.
Originado no século 18 pelos iluministas, o liberalismo é fundamentalmente uma filosofia de vida e um ideal político que afirma que os indivíduos são livres para realizar suas vontades como quiserem, contanto que não infrinjam a liberdade dos outros. O termo deriva do latim liber, que significa “livre”.
Segundo essa corrente filosófica e política, o maior bem da humanidade é a preservação da liberdade individual. Por isso, tradicionalmente, os liberais se vêem como “amigos da liberdade” e enfatizam o direito de as pessoas discordarem das verdades absolutas, dos credos e das autoridades. Em parte, isso pode ser considerado sadio para o estabelecimento de uma sociedade. Até o próprio Deus permite isso.
Deus não criou o cosmos como um lugar repleto de seres que o servem mecanicamente. Deus permite que esses seres discordem dEle se quiserem. Ele lhes concedeu o livre arbítrio. Agora, as pessoas que optarem por viver longe de Deus, sofrerão, ao final, as conseqüências disso: a tormenta do eterno afastamento de Deus.
Da mesma forma, em nossa sociedade, as pessoas devem ter a liberdade de crer no que quiserem crer e discordar do que desejarem. E sofram cada um as conseqüências positivas ou não de suas opções.
O problema, porém, é que os liberais, contraditoriamente, são extremamente intolerantes.
Ora, se discordar é um direito, porque não posso, como cristão, discordar do ponto de vista de alguém não-cristão sem ser taxado de intolerante? Isso significa que são “dois pesos, duas medidas”?
Os liberais atacam dogmas, mas têm, eles mesmos, um dogma que não aceitam de forma alguma que seja criticado: o relativismo. São absolutamente intolerantes quanto a isso. Aceitam a discordância dos absolutos, mas não aceitam que se discorde do relativismo. E mais: lutam pela imposição do relativismo sobre todos.
Assim, o grande problema do liberalismo é que ele cria um novo modelo de intolerância. A tolerância passa a se transformar em intolerância na medida em que somos forçados a ter de aceitar como igualmente certas as demais ideologias. O fundamentalismo liberal confunde a necessidade de coexistência pacífica entre as ideologias com a imposição da aceitação de todas as ideologias. Isso é um tremendo erro e injustiça. Podemos conviver pacificamente com as ideologias, mas não aceitar todas as ideologias.
Devido a essa visão liberal, hoje em dia somos atacados e em alguns momentos até proibidos de expressarmos nossas crenças e valores, mesmo que isso seja feito educadamente, sem agressões verbais. O que é isso, senão a imposição de um dogma?
Pregam a liberdade de expressão, mas ao mesmo tempo impedem a liberdade de expressão. O que é isso, senão intolerância?
São lúcidas as palavras proferidas há pouco tempo pelo católico romano Anthony Frontiero, do Conselho Pontifício de Justiça e Paz da Santa Sé, em intervenção na Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa, em Varsóvia: “Como demonstra a história, uma democracia sem valores pode converter-se facilmente em um totalitarismo aberto ou encoberto”.
Assim como um monarca deve respeitar os valores morais, senão estará instaurando um regime absolutista, a democracia deve ser também norteada pelos valores morais, e não pelo relativismo moral. Pensar o contrário é levar o sistema democrático à auto-destruição.
Uma democracia sem valores tem o poder de extinguir a democracia em si. Sem valores morais, o que nasceu sob o apanágio da tolerância se torna exatamente o seu oposto: um monstro de intolerância.

Falso discurso de liberdade e democracia para amordaçar a fé

Nesse prisma, em brilhante artigo publicado na edição 105 da revista Eclésia, o pastor presbiteriano Ricardo Barbosa de Souza descreve com perfeição o momento que estamos atravessando e as futuras conseqüências disso. Faço questão de reproduzir alguns trechos do artigo:
“Uma das contradições da cultura pós-moderna e globalizada é sua capacidade de romper fronteiras e preconceitos, tornando-a mais inclusiva e, ao mesmo tempo, criar outras fronteiras e preconceitos, tornando-a extremamente exclusiva e violenta. Nas últimas décadas, a civilização ocidental tem feito um enorme esforço para diminuir as distâncias entre as raças, romper com os preconceitos e a discriminação sociais e criar uma sociedade menos violenta e mais aberta à inclusão das minorias. Por outro lado, vemos uma enorme massa de excluídos que cresce a cada dia, transformando-se em alvos e agentes de violência e preconceitos jamais vistos”.
“A relativização dos valores morais, o rompimento das tradições e o colapso do modelo tradicional da família abriram espaço para a aceitação e inclusão dos novos modelos morais e sociais. Muitos desses modelos contrariam os princípios cristãos mais fundamentais e comprometem a saúde da sociedade; contudo, temos presenciado a reação de vários grupos que não admitem a contradição. Vivemos hoje o que o doutor James Houston chama de uma nova forma de fundamentalismo, o da ‘democracia liberal’, que impõe sobre nós a obrigação de aceitar e admirar tudo aquilo que contraria princípios e valores que fazem parte da consciência cristã”.
“Muitos cristãos sentem-se intimidados por não poderem expressar suas convicções religiosas ou morais diante do novo fundamentalismo. Nossa cultura tornou-se moralmente e religiosamente liberal e requer que todos sejamos igualmente liberais. Isso significa que, num futuro não muito distante, sejamos impedidos de falar da revelação bíblica do pecado ou mesmo de sustentar publicamente nossas convicções morais, sob o risco de sermos considerados preconceituosos”.
Imagino que, mais cedo do que pensamos, enfrentaremos uma forte resistência à afirmação bíblica de que Jesus é ‘o caminho, ‘a verdade’, ‘a vida’, de que ele é ‘o único Senhor’, de que ‘não há salvação fora dele’ e de que ele é o ‘único que pode perdoar nossos pecados’. Todas essas afirmações são, por si, uma agressão ao espírito ‘democrático’ da sociedade pós-moderna. Afirmar a exclusividade de Cristo implica na negação e rejeição de qualquer outro nome que possa nos reconciliar com Deus, e isso soa como um preconceito, uma forma de discriminação inaceitável. Afirmar que a Bíblia é a Palavra de Deus e que só ela traz a revelação do propósito redentor de Jesus é também uma afirmação que pode ser considerada preconceituosa, uma vez que nega todas as outras formas de revelação”.
“De certa forma, isso já vem acontecendo. A espiritualidade cristã pós-moderna vem se tornando cada dia mais light. Fala-se muito pouco sobre o arrependimento e o pecado; prega-se quase nada sobre a cruz e a ressurreição; as Escrituras vêm perdendo sua autoridade. Jesus vem sendo reduzido a um grande líder, alguém que nos deixou um bom exemplo para seguir – alguma coisa no mesmo nível de Buda, Ghandi, Dalai Lama ou outro grande líder da humanidade, mas nada muito além disso. Fala-se muito de um Deus que é Pai e nos aceita, ama, acolhe e perdoa, o que é certo e bíblico; mas corre-se o risco de, por trás dessa linguagem suave e atraente, embutir uma espiritualidade que pensa ser possível conhecer a Deus-Pai sem a mediação de seu Filho Jesus Cristo”.
“A primeira geração de cristãos pós-modernos já está aí. São crentes que pouco ou nada sabem da Palavra de Deus e demonstram pouco ou nenhum interesse em conhecê-la. Cultivam uma espiritualidade verticalista, com nenhuma consciência missionária, social ou política. Consideram tudo muito ‘normal’ e não vêem nenhuma relevância na cruz de Cristo. Acham que a radicalidade da fé bíblica é uma forma de fanatismo religioso e não demonstram nenhuma preocupação em lutar pelo que crêem, se é que crêem em alguma coisa pela qual valha a pena lutar”.
“O cristão pós-moderno é hoje desafiado a experimentar uma espiritualidade que o coloque na fronteira entre a comunhão vertical da oração, meditação, contemplação e intimidade com Deus, e o compromisso horizontal com a missão evangelizadora, com os pobres, com a justiça e o serviço; entre a inclusão, buscando receber, acolher e amar os diferentes, mas também rejeitar, confrontar e lutar contra o pecado e todas as suas formas de escravidão e aprisionamento; entre o diálogo inter-religioso na procura por mecanismos sociais mais justos, mas também na afirmação e compromisso com as verdades absolutas da revelação bíblica”.
“Que o Espírito Santo nos dê discernimento e coragem para uma fé e um espírito comprometidos com o Deus da Aliança, preservando a identidade cristã, mesmo que isso nos custe alguns processos”.
Ressalto as últimas palavras: “...mesmo que isso nos custe alguns processos”. Se a onda liberal não for detida, chegaremos a isso. Alguém duvida?

O que poderá nos reservar o futuro

Não sou alarmista, mas, verdade seja dita, se essa onda do fundamentalismo liberal vingar em nosso país, brevemente teremos uma fé amordaçada, tolhida, como vemos hoje em muitos países da Europa.
Alguém pode dizer: “Mas os ateus são minoria na população”. Mas quem disse que o fundamentalismo liberal pretende necessariamente acabar com a existência das religiões? Ela quer acabar com a sua influência, amordaçar a fé, deixá-la irrelevante na vida das pessoas, para que definhe aos poucos, sufocada, como está acontecendo já há alguns anos na Europa. Sempre existirão igrejas, mas se a mensagem cristã não puder mais influenciar as pessoas, o cristianismo esfriará, arrefecerá até ser apenas uma religião morta. Disse Jesus: “Quando o Filho do Homem voltar, porventura achará fé na Terra?”
Será um exagero crermos nessa probabilidade? Não! Há evidências concretas para pensarmos assim.
Na manhã do dia 20 de julho de 2003, o pastor Ake Green, líder da Igreja Pentecostal em Borgholm, Suécia, pregou a cerca de 50 participantes do culto em sua igreja uma mensagem contundente acerca do que a Bíblia diz sobre a homossexualidade. Aquela mensagem em uma pequena reunião de sua congregação acabou chegando aos ouvidos da comunidade homossexual naquele país e, em 29 de junho de 2004, Green foi sentenciado à prisão, onde ficou por um mês. A razão? A Corte em Kalmar julgou que sua mensagem de que “homossexualidade é pecado” foi uma afronta ao comportamento homossexual. Até onde se sabe, em nenhum momento de seu sermão Green xingou homossexuais ou fez chacotas com quem tem esse comportamento. Apenas pregou com amor e seriedade o que diz a Bíblia, mas foi preso.
Esse mesmo tipo de lei com interpretação subjetiva sobre o que é discriminação de homossexuais está sendo discutida no Brasil. Copiando o radicalismo dos esquerdistas europeus, a Câmara dos Deputados em Brasília aprovou no final de 2006 uma lei que torna crime de homofobia toda oposição à homossexualidade. Se aprovado pelo Senado e sancionado pelo presidente, o Projeto de Lei 5003/2001, hoje PLC 122/2006, tornará crime “qualquer manifestação contrária à orientação sexual e identidade de gênero”. A pena prevista é de 2 a 5 anos de prisão, sendo crime inafiançável.
Em vez de se assemelhar à lei canadense (que é mais equilibrada, pois condena a ofensa a homossexuais, mas respeita a liberdade de imprensa e de religião), o projeto de lei brasileiro procura inspiração, ao que parece, na lei sueca. O texto do projeto é claro: não está se falando de ter conduta discriminatória em razão de pessoas, mas, sim, em razão de comportamentos.
Ora, a Bíblia nos ensina que devemos amar a todos independentemente da situação, sejam eles homossexuais ou não. Porém, a mesma Bíblia diz que não devemos concordar com comportamentos que chocam-se com a Palavra de Deus, e entre eles está a homossexualidade (Rm 1.24-27; 1Co 6.10).
Homossexuais não devem ser xingados, porém a fé das pessoas e a liberdade de pensarem diferentemente devem também ser respeitadas. Uma coisa é ter o direito de ser homossexual, outra bem diferente é impedir que outros discordem dessa opção sexual e informem o que a Bíblia diz sobre isso. A Palavra de Deus afirma que seguir a vontade divina é uma escolha da própria pessoa (Ap 22.16-17). Todos têm o direito de optarem na área sexual como bem desejarem. Porém, as pessoas também têm o direito de informarem que a Palavra de Deus assevera que homossexualidade é pecado e que Deus transforma homossexuais, fazendo com que estes voltem à sua heterossexualidade se desejarem (1Co 6.10,11; Rm 1.16).
As pessoas têm todo o direito de serem homossexuais se quiserem e de não serem ofendidas, assim como é direito do cidadão discordar de uma opção e afirmar o que diz a Palavra de Deus sobre essa opção. Mas o texto do projeto de lei brasileiro tem exatamente o mesmo teor da lei anti-homofobia na Suécia, que levou à prisão o pastor pentecostal Ake Green por pregar que homossexualidade é pecado. Em outras palavras, se nada for feito, o que aconteceu com o pastor Ake Green poderá acontecer com pastores no Brasil em pouco tempo.

Universidades: habitat do livre pensar ou lugar de discriminação?

Mais um caso: No dia 18 de novembro de 2006, o jornal londrino The Times publicou uma matéria afirmando que estudantes cristãos, em especial grupos como a Aliança Bíblica Universitária, estão sendo discriminados, perseguidos e proibidos em universidades conceituadas da Grã-Bretanha, tais como Exeter, Edimburgo e Birmingham. O jornal trazia ainda um manifesto assinado por educadores e clérigos condenando tais acontecimentos e ressaltando a gravidade da situação: “Estudantes cristãos de muitas de nossas universidades estão sofrendo considerável oposição e discriminação, com violação de seus direitos de liberdade de expressão, liberdade de fé e liberdade de associação”.
Por mais absurdo que pareça, a universidade, que em tese é o habitat do livre pensar, passou a ser, em alguns lugares, um lugar de discriminação a cristãos. Detalhe: a maioria das grandes universidades ocidentais foi fundada por cristãos, que objetivavam a busca pelo saber e um espaço sadio para o livre pensar. Portanto, o que está acontecendo não é só uma injustiça em um país que se afirma democrático e de Primeiro Mundo, mas um desrespeito total à história dessas instituições.
Mesmo que esse nível de discriminação não seja uma realidade nas universidades brasileiras, sabe-se que em nosso país os estudantes cristãos são muitas vezes tolhidos e zombados por professores em plena sala de aula por causa da sua fé.
Há alguns anos, presenciei em sala de aula um professor pregar que a grande solução para os problemas da humanidade é o fim da religião. Segundo ele, o mundo só seria melhor com a vitória do ateísmo. Claro que não pude ficar calado. Comecei amistosamente um debate em que as idéias dele foram confrontadas e, ao final, a maioria esmagadora da turma, que antes assistia calada e condescendente suas afirmações, optou por discordar dele. Mas, nem sempre é assim. Há professores que sequer aceitam o debate e quem discordar de suas posições é rechaçado rápida e acidamente.
Tal posicionamento é mais comum do que se imagina. Está não só nas universidades, mas na mídia.
Cristãos e suas posições são ignorados flagrantemente em debates. São discriminados, escanteados. A fé é vista como arquiinimiga da Ciência e dos “avanços sociais”. É taxada como “coisa de ultrapassado e fanático”. Enquanto isso, as afirmações de ateus e liberais são vistas como genuínas, puras e perfeitas científica e socialmente. E quando alguém tenta contradizer isso, mesmo que polidamente, começa a guerra.
Veja o que está acontecendo nos Estados Unidos.
Ali, surgiu um movimento de contra-ataque a essa onda liberal, demonstrando a cosmovisão cristã como (1) a alternativa mais coerente para entender a vida e (2) um movimento sadio de contra-cultura com um sólido arcabouço científico. Resultado? Os ateus e liberais, pegos de surpresa pelas fortes argumentações da cosmovisão cristã, têm se esforçado desesperadamente para esconder ou minimizar essas argumentações e desacreditar o cristianismo como nunca antes fizeram em toda a história daquele país. Já estão, inclusive, apelando, partindo para um ataque baixo, nervoso, emocional e intolerante. Isso mesmo: acabaram as balas e agora estão jogando o revólver.
Vamos aos nomes.
Recentemente, três cientistas norte-americanos de destaque internacional lançaram livros pedindo exatamente o fim da religião. Não que eles pensem, ingenuamente, que um dia não mais existirão religiões no mundo, mas seus ataques pretendem influenciar o aumento das mordaças sobre a fé, para que ela perca a sua relevância. Para esses cientistas, o maior mal do mundo atende pelo nome de “religião” ou “fé”. Principalmente “fé cristã”.
O primeiro foi o zoólogo britânico Richard Dawkins, um dos mais conhecidos pesquisadores do evolucionismo. Ele publicou em setembro de 2006 o livro The God Delusion (A Ilusão de Deus), com base em um documentário que fez para a tevê britânica. Logo em seguida, ainda em 2006, o neurocientista norte-americano Sam Harris lançou Letter to a Christian Nation (Carta a uma Nação Cristã). Sua obra tenta desafiar a fé cristã, criticando-a com frágeis argumentos pró-ateísmo. O último, publicado em novembro de 2006 (e no Brasil em dezembro), é do filósofo norte-americano Daniel Dennett. Chama-se Breaking the Spell (Quebrando o encanto: a religião como fenômeno natural), e pretende explicar o surgimento da fé e o papel das religiões. Como define matéria publicada na revista Época, edição 443, de 13/11/06 (A igreja dos novos ateus), a mensagem central das três obras é que “a religiosidade faz mais mal do que bem à humanidade”.
Isto é, “Se não conseguimos vencê-los no debate, vamos eliminá-los!”
Bem “sadio”, não?
São essas idéias que têm sido propaladas hoje em dia, contando com todo o apoio da mídia, às vezes veladamente, às vezes não. Não estou dizendo com isso que creio que o mundo vai se tornar menos religioso devido a esses ataques. Não, o problema não é esse. A maioria dos seres humanos sempre será religiosa. O problema está na influência desse discurso anti-religioso nas decisões políticas que afetam a sociedade como um todo.
Essas idéias liberais anti-religiosas estão embutidas em atos políticos, em omissões descabidas ou em projetos de lei que vez por outra aparecem propondo limites à liberdade religiosa e criando mecanismos inibidores da proclamação da mensagem do Evangelho em sua integralidade.

Despertamento

A partir do momento que não podemos mais chamar de pecado o que a Bíblia chama de pecado e somos tolhidos ao tentar expressar nossa fé, estamos sendo amordaçados.
O objetivo deste texto é despertar o maior número possível de crentes para essa realidade, prevenir quanto à sutileza das mordaças que estão sendo preparadas, desmascarar as armadilhas dessa intolerância travestida de “tolerância” que está sendo pregada, despertar para a necessidade de municiar os cristãos com informações que possam ajudá-los em sua atividade apologética e conclamar cada cristão a buscar um avivamento. Isso porque, à luz da Bíblia, da experiência e da História, as maiores ferramentas contra esse tipo de onda são sempre o conhecimento, o engajamento e, claro, a unção do Espírito. Sem ela, qualquer engajamento é insuficiente.
Que Deus possa usar este e tantos outros textos como instrumentos para despertar consciências e avivar vidas.